
Receita Federal define tributação de honorários advocatícios em casos de parceria
Data: 16/09/2025
A Receita Federal entendeu que as sociedades de advogados, em casos de parcerias com outras bancas, podem reconhecer como receita bruta, na apuração do Imposto de Renda (IRPJ), CSLL, PIS e Cofins, apenas a parcela dos honorários que lhe couber, conforme estipulado em contrato. O valor repassado ao parceiro poderá ser desconsiderado, segundo o órgão , “desde que observadas as disposições da legislação tributária vigente e as normas estabelecidas pelo conselho profissional”.
O entendimento, contido na Solução de Consulta nº 161, editada recentemente pela Coordenação-Geral de Tributação (Cosit), é um avanço, especialmente no ponto relativo ao IRPJ e CSLL no lucro presumido, segundo especialistas ouvidos pelo Valor. Porém, acrescentam, traz requisitos não previstos em lei ou que podem acabar inviabilizando o cumprimento da norma.
Na solução de consulta, a Receita destaca que a Lei nº 8.906, de 1994, o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), valida, para fins tributários, a segregação de receitas por sociedades de advogados que atuem em regime de parceria. No entanto, de acordo com o órgão, a norma estabeleceria que essa atuação deve envolver o atendimento direto ao cliente por ambas as partes, “não sendo aplicável a situações em que uma das partes atua exclusivamente como contratada da outra, sem contato direto com o cliente”.
Para o advogado Breno de Paula, sócio do escritório Arquilau de Paula Advogados Associados, seria uma interpretação restritiva da lei, que só exige que as bancas “atuem em forma de parceria para o atendimento do cliente”. “Não é correto que a interpretação da lei restrinja o conteúdo e a natureza de como funciona uma parceria, que pode se dar de múltiplas formas, com múltiplas atribuições, que inclusive podem mudar de acordo com o tempo e com a necessidade do caso”, afirma.
O especialista cita ainda outro ponto que considera polêmico, o que exige que o contrato de parceria, com vários detalhes, seja “averbado à margem do registro da sociedade em cada Conselho Seccional da OAB”. A medida, com base em provimentos da OAB, diz ele, precisa ser revista pelo Conselho Federal “para adaptá-la à realidade da atividade e às múl tiplas formas de parcerias”.
“As parcerias são estabelecidas entre as partes de múltiplas maneiras e não necessariamente com essas todas essas formalidades. A realidade que se impõe é que um simples texto ou áudio formaliza a parceria. Inclusive muitas vezes nem é necessário tratar previamente, já que a parceria é longeva. O ajuste pode se dar ao final, sendo formalizado, justamente, quando da entrega dos valores ao parceiro”, diz ele.
Outro ponto da solução de consulta questionado por especialistas é o que estabelece que “somente a parcela do IRRF proporcional aos honorários reconhecidos como receita bruta própria pela consulente poderá ser aproveitada para fins de dedução do IRPJ apurado com base no lucro presumido”. “Esse ponto é evidentemente incorreto, já que subtrai indevidamente tributo pago. Basta assegurar o crédito integral, já que o tributo devido nesta operação será integralmente adimplido por ambas as partes”, afirma Breno de Paula.
Presidente da OAB, Beto Simonetti diz, em nota enviada ao Valor, que a decisão da Receita é um avanço. Mas que, para que seja plenamente operacional, ainda é preciso aprimorar pontos práticos: a exigência de atendimento conjunto ao cliente, a burocracia na averbação de contratos e a regulamentação das notas fiscais para o fracionamento do IRRF.
“Ou seja, não há um empecilho que inviabilize a medida, mas ajustes necessários para que funcione de forma efetiva em todo o país. A entidade continuará trabalhando para que a regulamentação avance e para que essa realidade legislativa seja plenamente operacional e viável para os escritórios em todo o país, afirma Simonetti.
Para ele, a solução de consulta “reflete o avanço legislativo promovido no Estatuto da Advocacia, que passou a reconhecer as parcerias entre escritórios como um instrumento legítimo de organização da profissão”. “Em um mundo que exige cada vez mais especialização, sem perder de vista a confiança do cliente no advogado, a Receita Federal confirma que cada parceiro deve assumir a responsabilidade tributária pela sua parte nos honorários. Isso traz segurança jurídica, adequação à realidade do mercado e representa uma vitória importante para a advocacia e para a sociedade”, diz.
João Pedro Strambi, advogado tributarista do VBD Advogados, também destaca que o entendimento manifestado pela Receita Federal “estabelece uma diretriz mais clara para as sociedades de advogados, especialmente por reconhecer a validade do Estatuto da OAB para fins tributários”. Temas envolvendo modelos de repartição de receita, diz, “sempre geram d úvidas ao contribuinte e interpretações conflitantes”.
Ele lembra que a Receita já havia sinalizado nesse sentido quando disciplinou a exclusão dessas receitas da base de cálculo do PIS e da Cofins (regime cumulativo), conforme Instrução Normativa RFB nº 2264, publicada em abril de 2025. “Com a solução de consulta, fica esclarecido o tratamento que o Fisco considera correto também para o IRPJ e para CSLL, no caso das sociedades optantes pelo lucro presumido”, afirma ele, acrescentando, contudo, que a formalização e averbação do contrato de parceria junto à OAB é um ponto de atenção e que a restrição pode gerar novos questionamentos.
“A Receita faz menção a provimentos do Conselho Federal da OAB que não se relacionam diretamente com a questão tratada. O Provimento nº 204/2021, que efetivamente trata do assunto e também foi citado pelo Fisco, não faz nenhuma referência à necessidade de averbação, indicando que a repartição seria comprovada somente pela apresentação do contrato”, diz.
Procurada pelo Valor, a Receita Federal não deu retorno até o fechamento da edição.
CNJ vai sugerir tribunal virtual misto para julgar demandas sobre IBS e CBS
Data: 17/09/2025
O Conselho Nacional de Justiça elaborou uma proposta de reforma processual tributária para criar uma espécie de tribunal virtual misto destinado a julgar questões relacionadas a IBS e CBS, tributos criados pela reforma tributária.
A proposta decorre do grupo de trabalho instituído em abril e presidido pelo presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal, ministro Luis Roberto Barroso. Ela ainda será apresentada, e sua análise caberá ao Congresso Nacional.
A ideia é criar uma jurisdição mista com competência nacional e composição paritária entre membros da Justiça Federal e das estaduais. Seu funcionamento será exclusivamente digital, desde as audiências até os julgamentos.
Segundo a proposta, haverá uma instância de primeiro grau, formada por juízes de todos os estados e do Distrito Federal, e uma instância revisora, com desembargadores de Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais.
A proposta incorpora uma ideia apresentada pela Advocacia-Geral da União ao grupo de trabalho. Ela foi adiantada por Frederico Montedonio Rego, juiz auxiliar da Presidência do CNJ, em evento da AGU nesta quarta-feira (17/9).
Segundo o magistrado, há também a previsão de uma regra de prevenção para garantir que todas as ações relacionadas a uma operação permaneçam a cargo de um só magistrado.
“É uma proposta que tem grau de inovação razoável, mas parte da experiência bem-sucedida dos Núcleos de Justiça 4.0”, explicou o juiz.
Culpa dos impostos
As alterações são necessárias por causa da forma como foram estruturados a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS, de competência federal e que substitui PIS e Cofins) e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS, de competência estadual e municipal para substituir ICMS e ISS).
As únicas diferenças entre os tributos são de alíquota e destinação. E isso faz com que uma operação possa ser questionada na Justiça Federal ou nas estaduais, com decisões potencialmente divergentes entre juízes.
Além disso, a reforma tributária inovou ao alterar a incidência do tributo. Com o ICMS, por exemplo, ela se dá na saída da mercadoria do estabelecimento. O IBS vai alterar essa ordem e a arrecadação será no local de destino do bem.
Isso abre a discussão sobre qual será o foro adequado para, por exemplo, ajuizar a execução fiscal: o de recolhimento ou do contribuinte? E se o contribuinte quiser anular a cobrança, onde deverá ajuizar a ação?
Restrições à compensação tributária: impactos da política fiscal
Data: 18/09/2025
Recentemente, a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, alterou de forma significativa seu posicionamento quanto ao prazo prescricional para compensações tributárias decorrentes de decisão transitada em julgado, conforme registrado no REsp 2178201 – RJ (2024/0402390-1). Até então, prevalecia o entendimento de que o prazo prescricional de cinco anos, previsto no artigo 168 do Código Tributário Nacional (CTN), deveria ser interpretado como o limite temporal apenas para o início da compensação, e não como restrição absoluta à utilização integral do saldo de crédito reconhecido.
Com isso, o artigo 106 da Instrução Normativa nº 2.055/21 estabelece que, no caso de crédito oriundo de decisão judicial transitada em julgado, a declaração de compensação pode ser apresentada até cinco anos após o trânsito em julgado ou a homologação da desistência da execução do título. Assim, iniciado o procedimento de habilitação do crédito, não há limitação temporal para sua utilização, permitindo a compensação progressiva até a extinção total do crédito.
Ocorre que, em recente mudança, a 2ª Turma do STJ passou a consolidar o entendimento de que “todas as PER/DCOMP precisam necessariamente ser transmitidas no prazo de cinco anos, a contar do trânsito em julgado”. Em outras palavras, significa dizer que todas as declarações de compensação devem ser apresentadas obrigatoriamente dentro desse período, o que altera substancialmente a prática anterior.
Esse novo entendimento gera dificuldades concretas, sobretudo para os contribuintes que não possuem, no período de cinco anos, débitos suficientes para compensar a integralidade do crédito homologado. Essa limitação prática pode implicar perda do direito de utilização de parte do crédito, ainda que reconhecido judicialmente, e representa um desafio adicional para empresas de diferentes portes.
A esse cenário se soma um movimento legislativo alinhado à mesma linha restritiva. No dia 22 de maio foi publicado o Decreto nº 12.466/25, que elevou a alíquota do IOF aplicável a uma série de operações financeiras. A medida, que teve forte repercussão negativa no mercado, acabou revista pelo governo federal. Como alternativa, e para compensar a eventual perda de arrecadação gerada pela revisão do IOF, foi publicada, em 11 de junho, a Medida Provisória (MP) nº 1.303, estabelecendo novas regras para a tributação de aplicações financeiras e de ativos virtuais no Brasil.
Entre as medidas anunciadas na MP, chama a atenção a proposta de limitação das compensações tributárias. De acordo com o governo federal, o objetivo central seria o de coibir práticas que o Fisco classifica como abusivas ou indevidas.
Nessa categoria incluem-se dois exemplos emblemáticos: (i) aquelas decorrentes de pagamento indevido ou a maior, quando realizadas com base em Documento de Arrecadação (Darf) inexistente; e (ii) aquelas oriundas do regime de incidência não cumulativa da contribuição para o PIS e da Cofins, quando os créditos não guardarem relação efetiva com a atividade econômica do sujeito passivo. Essas situações foram expressamente previstas no artigo 64 da MP nº 1.303/25, que promove alteração relevante no artigo 74 da Lei nº 9.430/96.
Embora a medida provisória não preveja multa por compensação indevida, a exposição de motivos do governo federal destaca a preocupação em aprimorar o sistema de compensação dos tributos administrados pela Receita Federal. Alega-se que foram identificados volumes expressivos de compensações com documentos de arrecadação inexistentes e créditos indevidos da contribuição para o PIS/Pasep e Cofins, incompatíveis com a atividade dos contribuintes, o que prejudica a arrecadação, afeta o erário público e gera desequilíbrios concorrenciais.
Apesar da justificativa apresentada, é claro o intento do governo federal de impor mais restrições à compensação de créditos tributários. A presunção automática de compensações indevidas, sem permitir a manifestação do contribuinte, viola princípios constitucionais como o contraditório, a ampla defesa e a busca pela verdade material.
No caso das compensações do regime não cumulativo da contribuição para o PIS e Cofins, quando os créditos não se relacionam com a atividade econômica do contribuinte, destaca-se a posição consolidada pelo STJ no Tema nº 779. O tribunal definiu que o conceito de insumo deve ser analisado segundo os critérios de essencialidade ou relevância, o que impede a Receita Federal de decidir unilateralmente sobre a relevância dos créditos sem uma análise concreta da atividade do contribuinte e da natureza do item ou serviço.
Diante da crescente complexidade jurídica, é essencial que as empresas reforcem a atenção nos procedimentos de apuração e compensação de créditos tributários, visando prevenir questionamentos fiscais e autuações pela Receita. Assim, recomenda-se que as companhias revisem suas práticas com o apoio de assessoria jurídica e contábil especializada, garantindo compensações seguras, conformidade com a legislação e minimizando riscos frente ao Fisco.
Fernando Bittencourt e Juliana Aragon Faria de Souza são, respectivamente, sócio-fundador do LFB Advogados e membro efetivo da Comissão de Direito Tributário da OAB-SP e da OAB-SC; e advogada na LFB Advogados e membro da Comissão Especial de Direito Tributário da OAB-SP
Procuradorias pedem alterações no projeto que regulamenta a reforma tributária
Data: 19/09/2025
Representantes das procuradorias das Fazendas nacional, estaduais, distrital e municipais pedem que seja restabelecido no Projeto de Lei Complementar (PLP) nº 108, que regulamenta a reforma tributária, a atribuição do Fórum de Harmonização Jurídica das Procuradorias para uniformizar interpretações jurídicas, inclusive para fins de dispensa de atuação perante o Poder Judiciário. O pedido consta em nota técnica apresentada pelo Conselho Nacional da Advocacia Pública Fiscal (Conap) ao relator do texto no Senado, senador Eduardo Braga (MDB-AM).
Pela proposta, a atribuição ficaria com o Comitê de Harmonização das Administrações Tributárias (Chat), que não tem participação de procuradores. “Você não pode tirar da advocacia pública a competência para interpretar a legislação”, diz a presidente do Conap e procuradora-geral da Fazenda Nacional, Anelize Lenzi Ruas de Almeida.
Se o texto for mantido como está, acrescenta, a saída seria pedir o veto desse ponto ou mesmo recorrer ao Judiciário com a alegação de violação à competência constitucional das procuradorias. “Só depois de chegarem milhares de processos ao Judiciário, a procuradoria poderá se manifestar”, afirma a procuradora-geral.
Além de, na prática, eventualmente receitas e procuradorias divergirem sobre a necessidade de seguir recorrendo em alguns temas – e o entendimento de um órgão não vincula o outro -, a mudança deixou entre alguns procuradores a impressão de tentativa de esvaziamento de algumas funções das procuradorias.
Para o Conap, a existência do Comitê de Harmonização das Administrações Tributárias, cujas resoluções vinculam apenas a atuação dos Fiscos (Receita Federal e Secretarias de Fazenda estaduais e municipais, ou seja, os órgãos de fiscalização e de cobrança administrativa), não supre a necessidade de atuação e harmonização das interpretações jurídicas realizadas pelas procuradorias. A advocacia pública atua em outras etapas de cobrança do crédito tributário e em outras instâncias (judiciais, consultivas e administrativas), além de exercer o controle de legalidade do crédito tributário com a finalidade de evitar litígios, diz a nota.
A oitiva obrigatória do Fórum de Harmonização Jurídica das Procuradorias estava prevista no texto aprovado pela Câmara dos Deputados. Foi excluída sob a justificativa de que as decisões do Chat vincularão, apenas, as administrações tributárias dos entes federativos. Na nota técnica, a Conap aponta que, apesar da ausência de efeitos vinculantes, é certo que a participação do Fórum de Harmonização Jurídica das Procuradorias na atividade de harmonização da interpretação do IBS e da CBS é “indispensável para prevenção e pacificação de litígios entre contribuinte e Fisco”.
Em outra nota técnica, o Conap critica o prazo de até 12 meses para inscrição de débito na dívida ativa previsto no PLP 108/2024. O grupo aponta que a proposta “enfrenta graves problemas conceituais e estruturais que ameaçam a segurança jurídica, a eficiência da arrecadação e violam preceitos constitucionais”. O trecho se refere apenas ao IBS (inscrições municipais e estaduais/distritais).
O parecer do relator apresentado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do PLP 108/2024, prevê que os entes federativos podem delegar ao Comitê Gestor do IBS (CGIBS) a competência para inscrever a dívida ativa fruto do inadimplemento do novo tributo e que o regulamento dele definirá o prazo máximo para a realização das atividades de cobrança administrativa, desde que não superior a 12 meses, contado da constituição definitiva do crédito tributário.
Segundo a Conap, o CGIBS, sendo um órgão de gestão administrativo-fiscal focado na arrecadação, não possui a natureza nem a distância necessárias para esse controle. “Delegar-lhe a competência de inscrição significa fundir as funções de quem constitui o crédito com quem valida sua legalidade final”, afirma em nota técnica.
A previsão de até 12 meses é vista como danosa porque o prazo retardaria o início da cobrança efetiva, dando margem a maior risco de fraude. “Este longo período cria uma perigosa janela de oportunidade para o devedor, que pode promover a dilapidação patrimonial e outras fraudes para esvaziar seus bens”, diz o texto. Medidas de proteção ao crédito público, como a presunção de fraude à execução só são ativadas após a inscrição, tornando a recuperação do crédito mais difícil quando ele chega à advocacia pública, segundo a nota.
A dívida refere-se apenas ao IBS, o que ainda leva a um descasamento em relação a como vai funcionar a CBS, segundo a presidente do Conap, que destaca a impossibilidade de a autoridade que lança o crédito realizar a inscrição em dívida ativa. O prazo de até 12 meses também fica muito afastado da previsão recomendada pela OCDE, de 90 dias. “Os estudos mostram que quanto antes começa a cobrança maior o índice de recuperabilidade daquele crédito”, afirma ela.
As questões apontadas nas notas técnicas são consideradas já avaliadas por técnicos que acompanham a tramitação da reforma no Senado. A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovou na quarta-feira o projeto que regulamenta a reforma tributária. O relator apresentou um substitutivo (texto alternativo) ao projeto recebido da Câmara dos Deputados. A matéria vai a Plenário em regime de urgência.
Em nota ao Valor, a assessoria técnica do senador explica que o Fórum de Harmonização Jurídica das Procuradorias terá competência para atuar como órgão consultivo do Comitê de Harmonização das Administrações Tributárias nas atividades de uniformização e interpretação das normas comuns relativas ao IBS e à CBS e analisar relevantes e disseminadas controvérsias jurídicas relativas aos tributos.
Ainda segundo a área técnica, as resoluções do Fórum irão vincular a PGFN e as Procuradorias dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios. Portanto, acrescenta, sua competência para harmonizar a atuação das procuradorias está garantida inclusive para fins de dispensa de atuação perante o Judiciário. “O que foi alterado foi a oitava obrigatória do órgão antes das deliberações do Chat, que continua podendo acontecer, só não será obrigatória, porque o Chat exerce competência de caráter normativo”.
Sobre a questão dos 12 meses para inscrição em dívida ativa, a assessoria técnica informa que o texto já veio da Câmara dos Deputados com esse prazo. “Embora seja um prazo bem mais alongado do que o aplicável no âmbito da União, ele reflete a realidade operacionalmente possível de diversos entes subnacionais, especialmente municípios menores.” Hoje , segundo a nota, muitos desses municípios praticam atualmente prazos bem maiores do que 12 meses.
Plenário vota regulamentação da reforma tributária na quarta
Data: 22/09/2025
Plenário vota na quarta-feira (24) o projeto que regulamenta a segunda parte da reforma tributária. A ordem do dia está marcada para as 16h e tem três itens na pauta.
O Projeto de Lei Complementar (PLP) 108/2024 foi aprovado na semana passada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). A proposta regula o Comitê Gestor que vai administrar o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), permitindo a implementação de um período-teste já em 2026, conforme previsto em lei. A matéria recebeu um substitutivo do relator, senador Eduardo Braga (MDB-AM).
O texto chega ao Plenário com um pedido de urgência aprovado pela CCJ. Até a manhã desta segunda-feira (22), o PLP 108/2024 havia recebido sete emendas de Plenário, que ainda estão pendentes de parecer. Se aprovado pelo Senado, o texto retorna à Câmara dos Deputados.
Medida provisória
Além da regulamentação da reforma tributária, o Plenário pode votar a medida provisória que incentiva parcerias com hospitais privados para acelerar o atendimento de pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) com médicos especialistas.
A MP 1.301/2025 foi aprovada em uma comissão mista de senadores e deputados, mas ainda precisa passar pelo Plenário da Câmara. Relatada pelo senador Otto Alencar (PSD-BA), a matéria perde a validade na próxima sexta-feira (26). O texto prevê:
• credenciamento de hospitais privados para atendimento a usuários do SUS com pagamento em créditos tributários;
• troca de débitos de operadoras de planos de saúde por prestação de serviços assistenciais; e
• execução direta, pela União, de ações e serviços especializados em situações de urgência.
Acordo internacional
O último item na pauta é o Projeto Decreto Legislativo (PDL) 390/2024, que aprova um acordo entre Brasil e Países Baixos (Holanda) sobre troca e proteção mútua de informações classificadas.
Entre outras medidas, o texto regulamenta a equivalência dos graus de sigilo. O relator na Comissão de Relações Exteriores (CRE) foi o senador Astronauta Marcos Pontes (PL-SP).
Comissões debatem possível cobrança pelo uso de sistemas da Reforma Tributária
Data: 23/09/2025
As comissões de Finanças e Tributação; e de Indústria, Comércio e Serviços da Câmara dos Deputados realizam audiência pública nesta terça-feira (23) para discutir a previsão de cobrança pelo uso de sistemas da Reforma Tributária.
O debate será realizado às 16 horas, no plenário 5, e será interativo.
Veja quem foi convidado e envie suas perguntas
A audiência foi solicitada pelos deputados Luiz Carlos Hauly (Pode-PR), Sargento Portugal (Pode-RJ), Júlio Cesar (PSD-PI) e Any Ortiz (Cidadania-RS).
Segundo os parlamentares, a modernização dos sistemas de informação é essencial para implementar a Reforma Tributária, regulamentada pela Emenda Constitucional 132 e pela Lei Complementar 214/25. Eles argumentam, no entanto, que a possibilidade de cobrar pelo uso de automações cria um custo adicional injustificado para os contribuintes.
A reforma exige que os sistemas de gestão empresarial operem simultaneamente dois sistemas distintos dentro de uma interface unificada para os usuários.
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NOTÍCIAS SOBRE DECISÕES ADMINISTRATIVAS FEDERAIS:
Carf: composição completa da Câmara Superior mantém mudança sobre JCP e multa
Data: 19/09/2025
Por maioria de 6 votos a 4, a 1ª Turma da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) manteve o entendimento de que não é possível deduzir, do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), despesas com pagamento à posteriori de Juros sobre Capital Próprio (JCP). No caso, o Citibank N.A. deliberou, em 2014, o pagamento de valores referentes aos exercícios de 2011 a 2013.
O julgamento teve início em abril, mas foi interrompido por um pedido de vista quando o placar estava em 4 a 3 favorável à empresa. Na ocasião, seguindo o padrão de decisões da turma, o desfecho seria definido por voto de qualidade, desfavorável ao contribuinte. Contudo, na quarta-feira (13/8), com a composição completa de dez conselheiros, incluindo o presidente do Carf, Carlos Higino, e a vice-presidente, Semíramis de Oliveira Duro, ambos votando com a Fazenda, o resultado se deu por maioria.
Voto vencido, a relatora, Maria Carolina Maldonado Kraljevic, considerou os precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ). A dedutibilidade dos JCP fora do ano em que houve a apuração será julgada como repetitivo pela 1ª Seção do STJ nos seguintes recursos: REsp 2.161.414, REsp 2.162.629, REsp 2.163.735 e REsp 2.162.248.
Para a divergência, linha vencedora, entende-se que o valor deve ser registrado no regime de competência, ou seja, no período em que os juros foram incorridos. Acrescentam ainda que o pagamento posterior representa nova destinação de lucro já apropriado.
Outro caso de JCP
Também envolvendo JCP extemporâneo, em caso que tem como parte o Safra Asset Management Ltda, o colegiado manteve as razões do processo anterior. Com este julgamento, a nova composição do colegiado já soma três acórdãos sobre o tema com placar diferente do que vinha sendo decidido por esta turma.
Com isso o assunto passa a ser passível de enunciado de súmula, já que para tanto são necessárias pelo menos três decisões tomadas por unanimidade ou maioria.
O Regimento Interno do Carf, no artigo 124, define que “qualquer conselheiro de Turma da Câmara Superior poderá propor enunciado de súmula, que trate de matéria de competência da respectiva turma, correspondente a tese por ela adotada em três acórdãos concordantes proferidos por unanimidade ou maioria”.
Ainda nesse caso, o colegiado analisou a concomitância entre multa isolada e multa de ofício, tema que também sofreu mudança de entendimento. Antes, a turma decidia a favor do contribuinte, mas agora, no segundo julgamento sobre o assunto com composição completa, o resultado, definido por voto de qualidade, foi favorável à Fazenda. Trata-se do processo 16327.721056/2013-81.
Carf afasta contribuição previdenciária sobre stock options
Data: 20/09/2025
Por maioria de 4 votos a 2, a 1ª Turma da 2ª Câmara da 2ª Seção do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) afastou a cobrança de contribuição previdenciária sobre planos de stock options oferecidos pela farmacêutica Hypera S.A. a seus funcionários. Venceu o entendimento de que os planos têm natureza mercantil.
A empresa foi autuada para a cobrança de contribuições previdenciárias relativas ao período de fevereiro de 2018 a dezembro de 2019. O advogado Maurício Faro, do BMA Advogados, sustentou que estão presentes todas as características que vêm sendo consideradas relevantes para confirmar a natureza mercantil do plano, ou seja, onerosidade, risco e voluntariedade.
O relator, conselheiro Fernando Gomes Favacho, concordou com a argumentação. O julgador também levou em consideração que a tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no Tema 1226 definiu que as stock options possuem natureza mercantil. O precedente, porém, trata do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF), e o tribunal superior não deliberou sobre a incidência da contribuição previdenciária nesses planos.
Os conselheiros Débora Fófano dos Santos e Marco Aurélio de Oliveira Barbosa (presidente do colegiado) divergiram sobre a natureza dos planos e ficaram vencidos.
O caso foi analisado no processo administrativo 15746.727105/2022-87 e envolve a Hypera S.A.
Colegiado do Carf muda entendimento e mantém multa isolada por voto de qualidade
Data: 21/09/2025
A 1ª Turma da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) manteve, por voto de qualidade, a aplicação de multa isolada à Companhia Mutual de Seguros (em processo de falência) em caso envolvendo omissão de receitas.
A decisão, relatada pelo conselheiro Luis Henrique Marotti Toselli, marcou uma mudança de entendimento da turma, que vinha decidindo, por maioria, em favor do contribuinte para cancelar esta penalidade.
Desta vez, como houve mudança no colegiado, tanto o presidente do Carf, Carlos Higino, quanto a vice-presidente, Semíramis Oliveira Duro, votaram a favor da Fazenda Nacional e, portanto, a decisão se deu por voto de qualidade.
Ficaram vencidos os conselheiros Luis Henrique Marotti Toselli, Maria Carolina Maldonado Kraljevic, Guilherme Adolfo dos Santos Mendes, Heldo Jorge dos Santos Pereira e Jandir José Dalle Lucca, que votaram para cancelar a multa.
Na origem, o caso tratou de autuação para cobrança de IRRF sobre pagamentos sem causa, com aplicação de multa isolada e multa de ofício qualificada.
O caso tramita com o número 16327.720611/2016-09.
Carf afasta autuação quase bilionária por ágio com uso de empresa veículo
Data: 23/09/2025
Por 6 votos a 2, o colegiado da 1ª Turma da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) derrubou a autuação de aproximadamente R$ 950 milhões relacionada à amortização de ágio com uso de empresa veículo. Tratou-se da estrutura de compra do grupo Notre Dame Intermédica Saúde S.A pelo fundo private equity Bain Capital, realizada a partir de duas holdings.
A fiscalização entendeu que a Bain Brazil (holding que efetuou a compra) teria sido utilizada unicamente para viabilizar o aproveitamento fiscal do ágio, atribuindo ao fundo estrangeiro a condição de real adquirente. A defesa, no entanto, sustentou que os recursos da operação vieram tanto de aportes estrangeiros via Fundo de Investimento em Participações (FIPs) quanto da emissão de debêntures no mercado nacional por uma terceira empresa (a BCBF), segunda holding utilizada na operação.
A advogada representante do contribuinte, Luciana Rosanova Galhardo, do Pinheiro Neto, argumentou que, como os FIPs não podem contrair dívidas, a terceira empresa assumiu esse papel e repassou os valores à Bain Brazil, que efetivou a compra do grupo. Após a aquisição, a Bain foi cindida e seu patrimônio, incluindo o ágio, foi incorporado pelas três empresas operacionais que integraram a estrutura da operação. Segundo a tributarista, a estrutura foi necessária para atender a exigências regulatórias, como a vedação de endividamento pelos FIPs e os limites impostos pela ANS às operadoras de saúde.
O relator, conselheiro Luis Henrique Marotti Toselli, entendeu que a estrutura adotada tinha propósito negocial, já que os recursos de aporte vieram de um fundo de investimento que, por restrições legais, não poderia assumir dívidas. Sendo assim, em seu entendimento, a utilização da empresa veículo teria propósito negocial. A conselheira Edeli Pereira Bessa divergiu ao entender que não seria possível a existência de uma holding na estrutura de aquisição sem que houvesse, de fato, uma relação de compra entre as empresas envolvidas. Ela foi acompanhada pelo conselheiro Guilherme Adolfo dos Santos Mendes.
Os processos são de número 16561.720078/2020-81, 16561.720080/2020-50 e 16561.720082/2020-49.
Na mesma sessão, o colegiado analisou outro caso envolvendo ágio com uso de holding como veículo. O processo 11080.733632/2017-83, da Brinox Metalurgica SA, envolve tanto amortização de ágio quanto dedução de juros pagos na emissão de debêntures para a captação de recursos à aquisições de participações societárias. O caso saiu com pedido de vista.
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- FEDERAIS:
STF valida regra que restringe créditos de IPI apenas a remetente de insumos
Data: 15/09/2025
O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou, por unanimidade, a constitucionalidade de dispositivo que suspende a cobrança do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) nas saídas de matérias-primas, produtos intermediários e materiais de embalagem destinados a determinados estabelecimentos industriais.
A análise ocorreu no julgamento virtual da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7135. A ação foi proposta pelo Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) contra o Presidente da República e o Congresso Nacional.
O relator do caso, ministro Gilmar Mendes, destacou que cabe ao legislador definir os limites do benefício fiscal, posição que foi integralmente seguida pelos demais ministros.
A discussão envolve o inciso 5º do artigo 29 da Lei 10.637/2002, que permite apenas ao estabelecimento industrial remetente (quem vende o insumo) manter e utilizar créditos de IPI, vedando a prerrogativa ao adquirente de tais bens. No caso concreto, o PSDB buscava estender o direito ao crédito ao adquirente de insumos submetidos ao regime de suspensão.
Para o relator, cabe ao legislador definir os limites do benefício fiscal, e o Judiciário não pode criar benefícios fiscais ou créditos presumidos, especialmente porque a suspensão do tributo na etapa anterior impede o direito ao crédito pelo adquirente.
“Trata-se de uma delimitação consciente, racional e legítima por parte do legislador ordinário, que decidiu restringir o incentivo fiscal à etapa inicial da cadeia produtiva, visando controlar o alcance da desoneração e preservar os efeitos da política industrial pretendida”, afirmou Mendes.
O ministro citou jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no REsp 1587197, segundo a qual não se pode presumir a extensão automática dos efeitos de normas tributárias relativas ao “estabelecimento industrial” para os chamados “equiparados”, sem previsão expressa.
Despesas de convenção coletiva geram créditos de PIS/Cofins
Data: 16/09/2025
Uma liminar incomum permitiu à Fiteca Tecidos, fábrica de tecelagem de Minas Gerais, tomar crédito de PIS e Cofins sobre despesas obrigatórias previstas em convenção coletiva de trabalho, como vale-alimentação, cesta básica e auxílio-lanche. A decisão foi dada pelo juiz Gustavo Figueiredo Melilo Carolino, da 2ª Vara Federal com Juizado Especial Federal (JEF) Adjunto de Sete Lagoas, que enquadrou os gastos como “insumos”.
O tema é antigo, já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em recurso repetitivo (temas 779 e 780). Desde o julgamento, em 2018, contribuintes tentam enquadrar determinadas despesas como bens ou serviços essenciais ou relevantes para a atividade econômica, requisitos para conseguir o creditamento. Os créditos servem como moeda para pagamento dos tributos, o que, na prática, reduz a carga tributária da empresa.
Segundo tributaristas e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), são raras as decisões favoráveis envolvendo convenção coletiva. Em nota ao Valor, a PGFN diz que a liminar é uma “decisão isolada sobre o assunto e que se encontra em dissonância da jurisprudência de todos os Tribunais Regionais Federais”. O órgão avalia a interposição de recurso e reforça que a liminar tem caráter provisório.
A PGFN e a Receita Federal têm entendimento contrário à decisão de Minas. Para os órgãos, conforme a Instrução Normativa nº 2.121/2022 e a Solução de Consulta Cosit nº 56/2024, é vedado o crédito para despesas de manutenção de mão de obra, sobretudo as de acordos com sindicatos, pois “não possuem força normativa” para fins tributários.
A Procuradoria diz, ainda em nota, que não entende os valores como insumos. “Segundo definido pelo STJ por ocasião dos julgamentos dos Temas Repetitivos nº 779 e 780, nem tudo o que é custo ou despesa da pessoa jurídica se caracteriza como insumo, mas apenas aquelas despesas consideradas essenciais ou relevantes no processo produtivo, o que não seria o caso das parcelas em discussão no processo acima”.
O órgão cita duas sentenças favoráveis à União sobre o tema, também de Minas. Uma delas foi contrária à Localiza (processo nº 1042444-77.2021.4.01.3800), outra à HI Transportes (processo nº 6000432-87.2024.4.06.3809). Há também outro caso da Localiza desfavorável, julgado pela 3ª Turma do TRF -6 (processo nº 1039127-25.2021.4.01.0000).
A tese da Fiteca Tecidos é de que os benefícios são uma obrigação legal, imposta pela convenção coletiva, que, desde a reforma trabalhista (Lei nº 13.467, de 2017), tem força de lei – o que foi ratificado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em julgamento vinculante (Tema 1046). Lembra que seu descumprime nto caracteriza um ilícito, passível de multa e fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
Para a fábrica de tecidos, as despesas se enquadram como insumos relevantes para o processo produtivo. Alega ainda que a vedação da Receita é ilegal e inconstitucional, violando princípios como o da não cumulatividade, razoabilidade e isonomia.
Na decisão, o juiz acata os argumentos e diz que a posição do Fisco “mostra-se flagrantemente equivocada e contrária ao ordenamento jurídico pátrio, especialmente após a reforma trabalhista de 2017 e o reconhecimento pelo STF da força normativa das CCTs [convenções coletivas de trabalho]”. Segundo ele, os benefícios “possuem natureza indenizatória, não integrando a base de cálculo da folha de pagamento para fins previdenciários”.
Por isso, seria possível o creditamento. “Tais despesas são essenciais para viabilizar a atividade da mão de obra, constituindo verdadeiros insumos do processo produtivo, uma vez que sua ausência comprometeria o desenvolvimento regular das atividades empresariais”, afirma o magistrado (processo nº 6002073-67.2025.4.06.3812).
A tributarista Maysa Pittondo Deligne, sócia do CPMG Advocacia que atua no caso, defende que o pagamento dos benefícios não é feito diretamente ao trabalhador, é preciso a intermediação de uma pessoa jurídica. “Não estamos pedindo crédito de todas as despesas da convenção coletiva, porque o que é pago diretamente ao empregado é despesa com mão de obra, esbarra na vedação legal”, diz.
Outros gastos que podem se enquadrar na tese, afirma, são plano de saúde, plano odontológico, vale-transporte, vale-refeição e seguro de vida. Mas como não havia a previsão nessa convenção coletiva, não foram pleiteadas na ação da Fiteca, acrescenta Maysa. “Vai depender do que está convencionado nos acordos”, diz. O impacto para a empresa é de R$ 100 mil, mas, para outras companhias com mais itens na convenção e maior folha de pagamento, o impacto pode ser milionário.
A tributarista afirma que a discussão é relevante, principalmente com a chegada da reforma tributária do consumo, cujo período de transição começa no ano que vem. “O PIS e Cofins vão acabar, mas ainda há discussão sobre os últimos cinco anos, então as discussões judiciais persistem mesmo após a reforma”, diz. “É um tema relevante para a empresa, pois ela já poderia estar tomando crédito e pagando o que ela precisa, nada além disso.”
Para o advogado Túlio Parente, sócio do Rivitti e Dias Advogados, o caso se encaixa na tese do STJ. “Esses gastos com cesta básica e vale-alimentação não configuram liberalidade do empregador. Na realidade, são despesas juridicamente obrigatórias, que, a nosso ver, atende ao critério de relevância estabelecido pelo STJ”, afirma.
Mesmo que a maioria dos TRFs seja contra a tese, a liminar “pode sinalizar uma evolução do Judiciário na compreensão do tema”. Na visão de Parente, a decisão ter sido favorável “é uma postura muito mais coerente com a razão de decidir do repetitivo e que revela muito mais aderência à realidade normativa das relações de trabalho”.
É possível ainda, acrescenta, que o tema seja novamente decidido pelo STJ, para que seja analisado diante do contexto da reforma trabalhista. “Se continuar um contencioso volumoso, acho que pode haver uma aceitação do STJ para voltar ao tema”, adiciona.
TRF-3 reduz tributação de juros sobre o capital próprio recebidos por empresa
Data: 17/09/2025
Os contribuintes ganharam um importante precedente sobre tributação de juros sobre o capital próprio (JCP). O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) concedeu a uma empresa de gestão patrimonial o direito de tributar os valores recebidos pela sistemática do lucro presumido, o que garante a inclusão de 32% do total na base de cálculo do Imposto de Renda (IRPJ) e da CSLL – e não tudo o que foi auferido, como exige a Receita Federal.
No pedido, o contribuinte defendeu que os valores de JCP são decorrentes da sua atividade empresarial (administração de bens, investimentos e participações societárias) e se enquadram como receita bruta operacional, e não como receita financeira acessória. Para ele, a legislação do IRPJ e da CSLL, especialmente os artigos 15 e 20 da Lei nº 9.249, de 1995, e 25 da Lei nº 9.430, de 1996, autorizariam a inclusão dos JCP na base de cálculo do lucro presumido, com aplicação da alíquota de 32%.
A decisão foi dada pela 6ª Turma do TRF-3 em embargos de declaração com efeitos infringentes (modificativos), depois de o contribuinte recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) para que se caso fosse reavaliado pelos desembargadores. “A primeira análise foi superficial e o STJ acolheu nosso pedido de que era preciso julgar o caso levando em consideração a atividade operacional da empresa”, diz o advogado Newton Domingueti, sócio da área tributária do Velloza Advogados.
A empresa recorreu ao Judiciário depois de a Receita Federal, por meio de solução de consulta, considerar juros sobre o capital próprio como receita bruta para fins de tributação pelo PIS e pela Cofins. O entendimento, dado em pedido formulado pelo próprio contribuinte, é da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) – o que vincula toda a fiscalização do país.
Na Solução de Consulta nº 84, de 2016, a Cosit entendeu que “as receitas decorrentes do recebimento de juros sobre o capital próprio auferidas por pessoa jurídica cujo objeto social seja a participação no capital social de outras sociedades compõem sua receita bruta para fins de apuração da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins devidos no regime de apuração cumulativa”.
Na decisão do TRF-3, além da solução de consulta, os desembargadores citam expressamente decisão da 1ª Seção do STJ (REsp 2089298), de 2024. No julgamento, os ministros decidiram que, no regime de lucro presumido, a receita bruta compreende todos os ingressos financeiros decorrentes da atividade empresarial – incluindo JCP, segundo especialistas, quando compatível com o objeto social da empresa.
“De rigor o acolhimento dos embargos de declaração, com efeitos infringentes, para reconhecer ser direito da impetrante a tributação dos juros sobre capital próprio na alíquota de 32% tanto para Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) quanto para a Contribuição Social sobre o Lucro (CSLL), tendo em vista que a própria Receita Federal admite que o recebimento de juros sobre capital próprio decorre da atividade empresarial da contribuinte”, diz em seu voto o relator do caso, desembargador Mairan Maia.
O tema, afirma Domingueti, é relativamente novo no Judiciário e ainda deverá ser analisado pelos tribunais superiores. “Esse precedente representa pronunciamento inédito em favor dos contribuintes enquadrados dentro da sistemática do lucro presumido e que auferem receitas de JCP em razão de sua atividade empresarial”, afirma.
Para João Colussi, sócio do Mattos Filho, a solução trazida pelo TRF-3 está correta e decorre dos fundamentos do princípio que criou o regime de tributação baseada no lucro presumido. “A legislação e a jurisprudência consolidaram que ‘receita bruta’ abrange todos os ingressos financeiros decorrentes da atividade principal da empresa, ou seja, receitas operacionais. Para empresas cujo objeto social é a administração de bens, participação societária ou investimentos, como a empresa objeto do julgamento, receitas como JCP, são consideradas operacionais, pois decorrem diretamente da atividade-fim da empresa”, diz.
De acordo com Diego Miguita, do Tauil & Chequer Advogados, sempre houve controvérsia em relação ao tratamento tributário dos juros sobre o capital próprio na apuração do lucro presumido, “especialmente pela assimetria na posição das autoridades fiscais”. “Na apuração do PIS e da Cofins, trata-se de receita bruta, ao passo que, na apuração do IRPJ e da CSLL, receita não operacional, que não se submete a margens de presunção”, afirma.
O principal argumento da Receita Federal, acrescenta, é a regra do artigo 51 da Lei nº 9.430/1996, segundo a qual os JCP devem adicionados ao lucro presumido, “o que, implicitamente, sugeriria que se trata de receita financeira não decorrente das atividades sociais da pessoa jurídica”.
“Contudo, a interpretação do dispositivo legal não deve ser restrita à sua literalidade, comportando análise contextualizada e sistemática da legislação tributária”, afirma ele, considerando acertada a decisão do TRF-3.
Em nota ao Valor, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) defende que a Lei nº 9.430/96, em seu artigo 51, estabelece que a receita de JCP deve ser diretamente adicionada à base de cálculo do IRPJ para fins de apuração do lucro presumido, não se submetendo aos percentuais previstos no artigo 15 da Lei nº 9.249/95.
“A legislação tributária brasileira possui um regramento específico para as receitas de JCP auferidas por pessoas jurídicas, independentemente de serem ou não consideradas receitas da atividade principal da empresa, o que impede a sua inclusão na base para aplicação dos percentuais de presunção dos artigos 15 e 20 da Lei nº 9.249/95”, afirma. E acrescenta: “Vale mencionar que, se o entendimento adotado no acórdão proferido nos autos 5012 583-08.2021.4.03.6100 fosse aplicado, a pessoa jurídica beneficiária acabaria pagando menos IRPJ do que o sócio pessoa física. Diante do exposto, e considerando que a decisão contraria a legislação vigente, a União Federal tem forte convicção na sua reversão.”
Juiz concede Habeas Data para Receita fornecer informações a empresa
Data: 23/09/2025
O Habeas Data é um remédio constitucional regulamentado pela Lei 9.507/1997 e tem como função garantir que qualquer pessoa física ou jurídica possa corrigir ou acessar suas informações nos bancos de dados de órgãos públicos.
Juiz entendeu que demora no fornecimento das informações poderia prejudicar empresa
Esse foi o fundamento adotado pelo juiz Frederico José Pinto de Azevedo, da 3ª Vara Federal de Pernambuco, para ordenar que a Receita Federal forneça informações requeridas por uma empresa do setor do agronegócio.
Conforme os autos, a empresa impetrou Habeas Data, com pedido liminar, para acessar o relatório Sistema de acompanhamento de Prejuízo, Lucro Inflacionário e Base de Cálculo Negativa da CSLL (Sapli) junto à Receita Federal.
Segundo a companhia, o acesso às informações é necessário para que ela possa formular proposta de transação tributária individual. A autora da ação alega que fez uma série de requerimentos administrativos para obter os dados, mas não obteve sucesso.
Ao analisar o caso, o juiz entendeu que o risco de ineficácia era evidente, já que a falta de informações inviabilizaria a elaboração de um plano de recuperação fiscal e a adesão a programas de transação tributária.
Diante disso, ele ordenou que a Receita fornecesse as informações requeridas dentro do prazo de 30 dias.
“Alerta-se que não há previsão legal que autorize a concessão de liminar em sede de Habeas Data. A decisão fortalece a tese de que, se forem relevantes os fundamentos, a falta de previsão na lei específica não deve impedir a concessão da liminar”, disse o advogado Pedro Holinger, do escritório Bento Muniz Advocacia, que atuou no caso.
Processo 0038471-64.2025.4.05.8300
União tenta no STF validar inclusão de tributos no cálculo do PIS/Cofins
Data: 23/09/2025
O governo federal, por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), adotou uma estratégia jurídica que surpreendeu os contribuintes: protocolou ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar validar a inclusão de tributo na base de cálculo de outro tributo. A medida, se aceita, resolveria, de uma tacada só, três teses sobre PIS e Cofins. Em ao menos duas delas, há chance de vitória para as empresas, segundo tributaristas ouvidos pelo Valor.
Em Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC 98), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, representado pela AGU, pede que o Supremo reconheça que o conceito de receita ou faturamento das empresas, para fins de cálculo da incidência do PIS e Cofins, deve incluir despesas tributárias.
A petição inicial, distribuída para relatoria da ministra Cármen Lúcia, cita especialmente três temas que já tiveram a repercussão geral reconhecida pelo STF: a inclusão do ISS na base de cálculo do PIS e Cofins (Tema 118), a inclusão do crédito presumido de ICMS decorrente de incentivos fiscais (Tema 843) e a inclusão do PIS e Cofins nas próprias bases (Tema 1067).
Nos dois primeiros temas, os contribuintes têm expectativas altas de obter entendimentos favoráveis. No Tema 118, com impacto estimado de R$ 35,4 bilhões, segundo a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2025, o placar está em quatro votos a dois contra a União – se considerados os votos dados anteriormente no Plenário Virtual, já há maioria para as empresas.
Três dos votos pró-contribuintes são de ministros aposentados: Celso de Mello, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber. Assim, não votam Nunes Marques, Cristiano Zanin e Flávio Dino.
No Tema 843, sobre o crédito presumido de ICMS, o impacto esperado é de R$ 16,5 bilhões. O julgamento foi iniciado no Plenário Virtual do STF em março de 2021, e houve maioria a favor dos contribuintes. Porém, antes do encerramento da sessão, o ministro Gilmar Mendes pediu destaque, o que transfere o caso para sessão presencial e zera o placar. Ainda não há previsão de julgamento.
O maior impacto é o do Tema 1067, de R$ 65,7 bilhões. Trata da exclusão do PIS e da Cofins duas suas próprias bases de cálculo. Esse também seria o caso de maior incerteza, pois ainda não houve discussão no processo, que teve a repercussão geral reconhecida em 2019.
Na ADC 98, o presidente justifica a necessidade de análise da questão com base no argumento de que a Corte não estabeleceu, no julgamento da tese do século (Tema 69), a inconstitucionalidade da incidência de um tributo sobre outro, só analisando as peculiaridades de reconhecimento do ICMS.
O que a ação pede é que seja afirmada a constitucionalidade do artigo 1º da Lei nº 10.637/2002, do artigo 1º da Lei nº 10.833/2003 e do artigo 2º da Lei nº 9.718/1998, que determinam que o PIS e a Cofins incidem sobre o total das receitas mensais das empresas, tanto no regime cumulativo quanto no não cumulativo. Em nota ao Valor, a AGU afirma que o julgamento vai “pacificar o ambiente de negócios” a partir de uma manifestação definitiva do STF, que poria “fim às discussões sobre o tema”.
A petição da AGU ressalta que a nova ação não abrange a discussão da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins, destacando que, em 2023, a decisão do Supremo sobre o assunto foi incorporada à legislação por meio da Lei nº 14.592.
De acordo com tributaristas, a interposição da ADC é uma tentativa de passar por cima da jurisprudência que vinha se formando a favor do contribuinte. Luiz Gustavo Bichara, sócio do Bichara Advogados, diz que o governo manobra para driblar o quórum julgador. “Além de ser um desrespeito para com o Supremo, é um ato que propala insegurança jurídica. Já passa de hora de se respeitar os precedentes judiciais”, afirma o advogado.
Ele lembra que a mesma estratégia já foi usada pela AGU quando foi discutida a “tese do século”, com a proposição da ADC 18. Na ocasião, como o Supremo priorizava ações de controle de constitucionalidade (como as ADCs) sobre outros tipos de processos, a tramitação da ADC travou o julgamento dos recursos originais por cerca de oito anos.
O tributarista Marcus Lívio, sócio do Salomão Advogados, afirma que o governo está tentando trazer a discussão para o campo da constitucionalidade para que ministros diferentes possam se manifestar. “Não se trata de discutir a tese em si, é uma estratégia para tirar a discussão do âmbito do repetitivo para analisar a legislação pelo ângulo constitucional. Tira da repercussão geral para levar para uma discussão em abstrato”, afirma.
Mas mesmo que essa seja a intenção, o Supremo não deveria sequer conhecer o pedido, segundo Marco Behrndt, sócio tributarista do Machado Meyer. O especialista afirma que os dispositivos apontados pela AGU como fonte da controvérsia sobre o conceito de faturamento, na verdade, remetem ao conceito que está na Constituição, no artigo 195, inciso I, alínea “b”, que afirma que as contribuições sociais devidas pelas empresas incidem sobre a receita ou o faturamento.
“Quando julgou o Tema 69 [tese do século], o Supremo já disse que estava definindo o conceito de receita e faturamento ‘à luz da Constituição’. O conceito não está nas leis apontadas, está na própria Constituição. Como a análise constitucional já foi feita, a meu ver, não caberia essa análise proposta”, diz.
Parte da argumentação do governo é consequencialista, e, por isso, não deve prosperar, afirma Rafael Nichele, do escritório Rafael Nichele Advogados Associados. De acordo com o tributarista, o impacto orçamentário não pode se sobrepor ao argumento jurídico.
“Esse tipo de argumentação já foi usado no julgamento do Tema 69, que foi batizado de tese do século até com base no impacto bilionário para os cofres da Fazenda. E esse argumento está sendo trazido para tentar reabrir o que o STF já decidiu sobre o conceito de receita”, diz.
A AGU, por sua vez, na nota ao Valor, argumenta que os recursos partem da mesma lógica, e que “submeter tema de tamanha relevância para o tribunal, a fim de que possa decidir de forma conjunta e uniforme, é postura legítima, que respeita as regras vigentes, a dinâmica de julgamentos da Corte e o sistema de precedentes judiciais”.
Também por nota, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), que defende a União nos recursos extraordinários questionados, afirma que o assunto está sendo conduzido pela AGU.
STF afasta cobrança de ITCMD sobre doação ou herança no exterior
Data: 22/09/2025
Uma lacuna legislativa tem permitido a contribuintes receberem doações ou herança sem pagar o ITCMD. São casos envolvendo transmissões de bens instituídas no exterior. Em duas decisões recentes, a ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), afastou a cobrança do imposto estadual. Uma delas já foi ratificada pela 1ª Turma e a outra é analisada nesta semana, no Plenário Virtual.
São as primeiras manifestações do Supremo sobre o assunto, de acordo com tributaristas. Nos dois processos, a ministra negou recursos do Estado de São Paulo e manteve o entendimento do Tribunal de Justiça (TJSP) de que não há respaldo legal para a tributação.
A tese dos contribuintes é que não há norma vigente válida que autorize a incidência do tributo – lei complementar federal ou estadual. Ao Valor, a Procuradoria Geral do Estado de São Paulo (PGE-SP) informou que vai recorrer.
O ITCMD incide sobre doações e heranças e a alíquota varia de 4% a 8%. De janeiro a julho deste ano, o governo paulista arrecadou R$ 2,7 bilhões com o tributo, 43% a menos que o mesmo período de 2024. Representou 12% da receita tributária em 2025, de R$ 22,3 bilhões até então.
A polêmica surgiu com a edição da Emenda Constitucional nº 132/23 – a reforma tributária. O texto estabelece que, enquanto não for editada lei complementar sobre o tema pelo Congresso Nacional, valem as normas estaduais. Só que a lei paulista foi considerada inconstitucional pelo TJSP, em 2011, e pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 2021, com repercussão geral – o que vale para outros Estados e o Distrito Federal.
Os ministros definiram que os Estados e o Distrito Federal não possuem competência legislativa para instituir a cobrança de ITCMD sobre doações e heranças no exterior (RE 851108). De acordo com eles, a Constituição Federal estabelece que cabe à lei complementar federal – e não a leis estaduais – regular a questão. Até hoje, a norma federal não foi editada, segundo advogados.
A Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo (Sefaz-SP) entende que é possível cobrar o imposto mesmo sem nova lei estadual. Na visão do órgão, a EC 132/23 torna novamente válida a Lei nº 10.705, de 2000, considerada inconstitucional. Essa argumentação foi negada pelo TJSP, o que foi mantido pela ministra Cármen Lúcia.
Um dos casos trata de doação feita por contribuinte no Reino Unido para donatário em São Paulo (RE 1553620). Na visão da relatora, o TJSP aplicou de forma correta a tese de repercussão geral do STF. Ela seguiu o parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR). “Como assinalado no acórdão recorrido, a ausência de base legal a sustentar a cobrança do imposto estadual torna inviável o reconhecimento da incidência tributária na espécie em exame, mesmo após a edição da Emenda Constitucional nº 132/2023”, diz ela no voto.
A PGE-SP, no recurso, argumentava que o imposto poderia ser cobrado a partir de 2023, por conta da emenda constitucional. Mas sobre esse ponto, a ministra afirma que envolve reanálise de prova, o que não pode ser feito pelo STF.
No novo agravo em análise nesta semana no Plenário Virtual, a ministra voltou a rejeitar o pedido do órgão e aplicou multa de 1% por “abuso do direito de recorrer” se o entendimento for unânime. Ainda faltam os votos dos outros quatro ministros. A votação acaba na sexta-feira.
O segundo processo envolve a transmissão de quotas de uma empresa localizada nas Ilhas Britânicas, em razão de abertura de sucessão no Brasil – repasse de uma mãe aos filhos. Nesse caso, em segredo de justiça, a ministra frisou que é preciso não só lei estadual, mas lei complementar para permitir a incidência do ITCMD – na ação, o tributo cobrado é de R$ 3 milhões.
“É necessária, nos termos da alínea a do inciso III do parágrafo 1º do artigo 155 da Constituição da República, a edição de lei complementar federal disciplinando as normais gerais para a incidência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCMD, quando envolver doador residente ou domiciliado no exterior e os bens doados estiverem localizados em território brasileiro”, afirma a relatora na decisão, mantida pela 1ª Turma por unanimidade.
O advogado Ricardo Hiroshi Akamine, sócio do PK Advogados que atua no caso, entende que, numa visão conservadora, só é necessário hoje a lei estadual. “O artigo 16 da emenda constitucional permite que os Estados cobrem ITCMD até que a lei complementar seja editada”, diz.
Akamine afirma que já tem ação transitada em julgado sobre o tema em que o governo de São Paulo nem levou a questão aos tribunais superiores. Há outro caso em Minas Gerais, que não chegou no Supremo. “O STF tem declaração de inconstitucionalidade envolvendo praticamente todos os Estados, determinando lei complementar.”
O tributarista Luiz Gustavo Simionato, do LCSC Advogados que atua no caso de doação no Reino Unido, acredita ser difícil a Fazenda reverter o entendimento da decisão monocrática. “A própria ministra cita uma decisão do ministro Alexandre de Moraes em que ele deixa claro que o artigo 4º da lei de São Paulo, a nº 10.705, foi declarado inconstitucional. Então é como se não existisse legislação estadual atualmente que permita essa cobrança”, afirma o advogado, citando a Rcl 58187.
Simionato lembra do Projeto de Lei (PL) nº 7/2024 em trâmite na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), destinado à instituição do imposto, mas que ainda não foi aprovado – há ainda o PL nº 199/2025 tramitando na Casa, também pendente de aprovação. Antes da sanção de nova norma, não há como o Estado fazer a cobrança, diz. “A Constituição ainda exige a lei complementar, mas, com a emenda constitucional, entendo que a partir da edição dessa nova lei, o Estado poderá cobrar o imposto”, completa.
Segundo advogados, a situação ocorre em outros Estados, como Minas Gerais, Espírito Santo e Rio de Janeiro, que também não editaram novas leis sobre o assunto desde 2023. Já Paraná, Pernambuco, Amazonas, Paraíba, Piauí, Rio Grande do Norte e Bahia criaram novas normas.
O advogado Ricardo Santos, sócio do Lefosse, afirma que as decisões de Cármen Lúcia chamaram a atenção do mercado. Na visão dele, o entendimento da ministra “está alinhado com a jurisprudência do Supremo”. “A tese do Fisco é a questão da constitucionalidade superveniente e já houve algumas decisões do STF que reconheceram não existir constitucionalidade superveniente”, diz ele, citando o RE 390840 e o RE 346084. “Se uma lei foi declarada inconstitucional, é necessário uma nova prevendo a instituição do tributo.”
Ele também lembra de dois julgados de 2025 em que o Supremo afirmou não ser necessário os Estados editarem novas leis para a cobrança, mas elas só produziriam efeitos a partir da edição da lei complementar (RE 1525264 e RE 1527727).
Santos reforça que entre 2021, quando o Supremo declarou a lei de São Paulo inconstitucional, e 2023, quando foi editada a EC 132, não se pode cobrar o tributo. “A partir de 2023, com a lei nacional, aí sim todos os Estados puderam passar a ter uma lei cobrando o imposto, mas nem todos editaram”, diz.
Em nota, a PGE-SP afirma que recorrerá das decisões, para que se reconheça a vigência do artigo 16 da EC nº 132/2023 e “a plena eficácia do artigo 2º da Lei Estadual nº 10.705/2000”. “A PGE-SP permanece convicta de que a reforma tributária realizada pelo artigo 16 da Emenda Constitucional nº 132/2023 supriu diretamente o vácuo legislativo identificado pelo STF no Tema 825 da repercussão geral e na ADI 6.830 e ampliou a eficácia da legislação tributária estadual para autorizar a cobrança do ITCMD sem distinção entre transmissões nacionais e internacionais”, diz.
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