
Governo desiste de contar com “tribunal de impostos” para turbinar arrecadação
Dia 30/06/2025
Ao anunciar o congelamento de despesas e aumento no IOF para cumprir as metas fiscais, a equipe econômica do governo também informou ter desistido de uma das estratégias arrecadatórias menos frutíferas da administração Lula 3: os recursos advindos dos julgamentos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, o Carf, uma espécie de “tribunal de impostos”.
No início do ano, em mais uma tentativa de mostrar compromisso com a meta fiscal e interesse em tapar o rombo nas contas públicas, o governo federal tinha voltado a inflar a previsão de arrecadação com os julgamentos do Carf. A prática já havia sido adotada em 2024 com as mesmas inconsistências.
Para se ter uma ideia, no ano passado, o governo Lula projetou arrecadar R$ 55 bilhões com as sentenças proferidas pelo órgão. No entanto, o valor real arrecadado foi de R$ 308 milhões – ou seja, apenas 0,55% do esperado.
Mesmo diante do fiasco na arrecadação, o governo retomou o otimismo em seguida, ainda que de forma um pouco mais comedida. Na peça orçamentária de 2025, previu que a receita advinda das decisões do Carf chegaria a R$ 28,6 bilhões.
Mas precisou voltar atrás em face da evidente discrepância entre expectativas e realidade. Durante o anúncio do pacote de congelamento, o governo zerou as projeções arrecadatórias relacionadas ao órgão.
As apostas em arrecadação de dezenas ou centenas de bilhões de reais se fiavam no retorno do chamado voto de qualidade, estabelecido pela Lei 14.689 de 2023. No entanto, como os próprios integrantes da equipe econômica esclareceram, o mecanismo acabou favorecendo a extensão da contenda, tirando-a da esfera administrativa e levando para o Judiciário.
Antes mesmo da desistência, integrantes da equipe econômica já haviam afirmado que a arrecadação por meio do órgão era improvável.
O chefe do Centro de Estudos Tributários e Aduaneiros da Receita Federal, Claudemir Malaquias, havia reconhecido que o governo errou ao utilizar projeções superestimadas, e que o valor projetado para este ano havia utilizado a mesma metodologia como base, desenvolvida pelo próprio Carf.
Processos sobre ágio se tornaram o principal foco do Carf
Boa parte do otimismo arrecadatório do governo se baseou em julgamentos relacionados ao ágio — que é o montante pago acima do valor contábil dos ativos nas negociações para compra ou reorganização societária de uma empresa, com base em expectativas futuras de lucratividade.
Em 2024, a Câmara Superior do Carf julgou 122 processos a esse respeito, 100% a mais que em 2023, quando foram proferidas 61 decisões sobre o tema. Considerando as câmaras inferiores, as turmas ordinárias, o número sobe para 172.
Legislação prevê descontos de IR e CSLL em operações de ágio
A legislação brasileira permite a amortização do ágio para reduzir a base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
O benefício fiscal foi introduzido pela Lei 9.532/1997 para, supostamente, incentivar grupos econômicos a adquirirem com ágio as estatais leiloadas no programa de desestatização em curso naquele momento, lembra Helder Santos, especialista em gestão tributária na Fipecafi.
Ele destaca que, até 2014, com a publicação da Lei 12.973/2014, quando foram introduzidas mudanças nas regras, não havia limitação legal para o uso do ágio em reorganizações societárias dentro de um mesmo grupo econômico.
Nova legislação restringiu ágio entre empresas do mesmo grupo
As ações sobre ágio no Carf têm por base essa nova legislação, pois, entre outras modificações, ela proibiu a amortização do ágio interno – quando é feito na negociação ou reorganização societária entre empresas do mesmo grupo.
Além disso, a nova norma passou a exigir que haja propósito negocial quando há a constituição de uma empresa-veículo – uma companhia criada especificamente para viabilizar a aquisição de outra, como ocorre com a criação de holdings para captação de investimentos internacionais, por exemplo.
Priscila Dias, advogada do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), afirma que, nos últimos anos, a Receita Federal adotou uma postura mais rigorosa em relação ao ágio interno e às empresas-veículo.
“A desconfiança se transforma em autuação quando o Fisco entende que não há um propósito negocial legítimo por trás da operação, ou seja, quando identifica que a aquisição ocorreu apenas para obtenção de benefício fiscal”, afirma.
Especialista afasta possível desalinho entre Carf e Receita
Questionado se a diferença entre as estimativas do governo para o Carf e o resultado dos julgamentos indica desalinho de perspectivas, Helder Santos, da Fipecafi, afirma ser improvável.
Ele avalia que os auditores agem no sentido de encontrar possíveis irregularidades na geração do ágio. E que é esperada uma avaliação rigorosa das provas apresentadas, podendo, inclusive, conduzir a uma decisão contrária àquela que motivou a oficialização da infração.
“Isso demonstra a necessidade de existência desse julgamento na esfera administrativa, reduzindo o excesso de judicialização desnecessária”, avaliou. Ele ainda lembra que o Carf é composto por um número igual de representantes da Fazenda Nacional e dos contribuintes.
Carf adota postura cautelosa
Por outro lado, Priscila Dias, do IBPT, avalia que, enquanto a Receita tende a autuar operações de ágio nas quais não identifica propósito negocial, o Carf adota postura mais cautelosa.
Segundo a advogada, o órgão reconhece que tais operações “podem possuir justificativa válida, ainda que não estejam formalizadas nos termos exigidos pela Receita”.
Além de frustrar as previsões de arrecadação, como, de fato, tem acontecido, ela alerta que as diferenças entre as perspectivas da Receita e do Carf podem, até mesmo, trazer insegurança jurídica para as empresas, que ficam expostas a autuações mesmo quando agem dentro da legalidade.
Estimativas governamentais pressionam Carf para mais arrecadação
Priscila Dias afirma que, obviamente, houve pressão governamental para aumentar a arrecadação via decisões do Carf, prevendo que a redução do estoque de processos pendentes no órgão levasse ao pagamento de multas.
Em 2024, o Carf julgou mais de 18 mil processos, representando aumento significativo em relação a 2023. A elevação das apostas no Carf veio das expectativas criadas com a instituição do voto de qualidade, trazido pela Lei 14.689/2023.
Segundo José Helder, a estimativa de R$ 55 bilhões em arrecadação em 2024 dependia do voto de qualidade — o desempate feito por representantes da Fazenda no Carf. Mas, na prática, o mecanismo teve o efeito contrário ao pretendido.
STF retoma julgamentos em agosto com pauta tributária bilionária
Data: 30/06/2025
O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma os julgamentos, em agosto, com uma pauta tributária bilionária. Nela estão processos que não teve tempo de julgar nas sessões do primeiro semestre, como a incidência de Cide-Royalties nas remessas financeiras enviadas ao exterior. Os casos se concentram em sessão extraordinária de sexta-feira, dia 1º de agosto.
No caso de Cide-Royalties, a estimativa de impacto para a União é de R$ 19,6 bilhões, conforme indicado na Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2026. Por ano, a perda na arrecadação seria de R$ 4 bilhões, segundo a Fazenda Nacional.
A Corte analisa se a Cide pode ser cobrada apenas de empresas da área de tecnologia ou sobre qualquer empresa que preste serviços técnicos-administrativos. Atualmente, a Receita Federal tributa também remessas para pagamentos de diversos tipos de contrato, como de advocacia e assistência administrativa para registro de patente no exterior.
Os ministros divergem sobre a possibilidade de tributação de remessas alheias à exploração de tecnologia estrangeira. Para o relator, ministro Luiz Fux, a Cide-Royalties só poderia incidir sobre contratos com exploração de tecnologia. Porém, para o ministro Flávio Dino, a base de tributação pode ser mais ampla (RE 928943).
Multas tributárias
Também consta na pauta o julgamento o processo sobre a existência de limite para a aplicação de multas tributárias. A discussão é sobre os percentuais cobrados pelos Fiscos em caso de descumprimento ou erro nas chamadas obrigações acessórias — declarações e emissões de documentos fiscais exigidos junto com o pagamento de tributos.
O caso já teve três votos, mas foi suspenso para ser julgado no Plenário presencial, por um destaque feito pelo ministro Cristiano Zanin (RE 640452). Existem duas linhas de voto, ambas indicam que precisa haver limite para a aplicação dessas multas, mas discordam em relação ao patamar que deve ser fixado.
Os ministros também poderão decidir sobre a inclusão de empresa integrante de grupo econômico em execução trabalhista, sem que ela tenha participado do processo de conhecimento.
Contribuição sindical
No mesmo dia ainda está na pauta a validade de dispositivos da Lei nº 11.648, de 2008, que trata da destinação de 10% da contribuição sindical para as centrais sindicais. A alegação, na ação, é de que os recursos da contribuição sindical têm finalidade específica, “expressamente constitucional”, e não podem ser usados para o custeio de atividades que extrapolem os limites das categorias profissionais (ADI 4067). O julgamento começou no ano de 2009.
Execução trabalhista
O STF também pode retomar o julgamento em que vai discutir a possibilidade de empresas de um mesmo grupo econômico serem incluídas na fase de cobrança de uma condenação trabalhista (execução), mesmo que não tenham participado do processo e do julgamento. O processo será retomado com o voto vista do ministro Alexandre de Moraes (RE 1387795) no dia 6 de agosto.
No caso concreto, a Rodovias das Colinas recorre contra decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST). A Corte trabalhista admitiu sua inclusão na execução de uma sentença trabalhista sem que tivesse participado do processo desde o início. Isso permite a penhora ou o bloqueio de bens para garantir o pagamento da dívida pela qual a outra empresa do grupo foi condenada.
Tese do século
Já na sessão do dia 13 de agosto, os ministros poderão analisar a ação que discute a validade da lei federal que obriga as distribuidoras de energia elétrica a devolverem aos consumidores os tributos recolhidos a mais por consumidores. O julgamento é decorrente da “tese do século”, pela qual o STF definiu que o ICMS deve ser excluído da base de cálculo do PIS e da Cofins. Na prática, a devolução se dá por revisão tarifária.
Nesse caso, a maioria dos ministros considera a lei constitucional, mas não há consenso sobre a prescrição, se ela será de cinco ou dez anos. O tema será julgado em ação (ADI 7324) proposta pela Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), que questiona o artigo 1º da Lei Federal nº 14.385, de 2022, que disciplina a devolução de valores de tributos recolhidos a mais pelas prestadoras do serviço público de distribuição de energia elétrica.
Receita limita uso de créditos por mineradoras
Data: 02/07/2025
A Receita Federal esclareceu às mineradoras que despesas com a “descaracterização de barragens a montante” – desativação – não geram créditos de PIS e Cofins. Indiretamente, o entendimento aumenta a carga tributária dessas companhias. A resposta do Fisco consta na Solução de Consulta da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) nº 108, de 2025, que orienta os fiscais do país e, segundo tributaristas, pode ser um sinal de alerta para outros setores.
A empresa que fez a consulta está em processo de descaracterização de algumas barragens. Explicou à Receita que as barragens de rejeitos de mineração construídas pelo método a montante têm as estruturas de contenção construídas sobre os próprios rejeitos. Após acidentes recentes com barragens do tipo, ficou proibido o uso deste método de construção e tornou-se obrigatória a desativação das existentes.
A empresa argumentou ao Fisco que teria direito aos créditos porque, para cumprir a nova legislação regulatória e ambiental, precisa comprar uma série de bens e serviços como construção civil, demolição, estudos geológicos e reflorestamento.
Apontou ainda que esses bens e serviços estão inseridos no seu processo produtivo, sendo essenciais para a atividade principal, considerando-se as exigências normativas e a própria natureza da atividade mineradora.
Na solução de consulta, a Receita considera que a descaracterização de barragens construídas a montante resulte da vedação desse método construtivo por normas legais. Contudo, reforça fundamentos e conclusões adotados em uma outra Solução de Consulta Cosit, de nº 193, de 2024, que tratou da “desmobilização de minas já exauridas”.
Conforme o entendimento de 2024, nos casos de bens e serviços que a legislação específica exige que a companhia use em suas atividades, a permissão para o aproveitamento de créditos pela compra de insumos vale quanto “aos itens exigidos para que o bem produzido ou o serviço prestado possa ser disponibilizado para venda, ainda que já finalizada a produção ou prestação”.
“Porém, esta permissão não alcança as hipóteses nas quais a circunstância geradora dos dispêndios ocorre após a venda do produto ou a prestação do serviço”, afirma a Receita sobre os custos para a desativação de barragens. Para o Fisco, o uso de créditos de PIS/Cofins não é possível, nesse caso, porque são “despesas com itens estranhos à produção de bens destinados à venda ou à prestação de serviços”.
Para Tiago Severini, sócio do Vieira Rezende Advogados, “a Receita entende que sendo atividade feita depois de gerar receitas não gera créditos, como se essa atividade não fosse necessária, mas ela é”. “É obrigatório, tanto pela parte regulatória como pela ambiental”, acrescenta.
Segundo o advogado, a vedação ao uso de créditos desses gastos poderá atrapalhar novos investimentos. Isso porque, com o crédito não reconhecido, como a empresa já gerou receita, vai diminuir a margem. “E no projeto seguinte ela vai considerar que não tem direito ao crédito no final, o que aumenta o custo do projeto e, assim, ele pode não ser viável economicamente”, diz.
Por meio dessa mesma solução de consulta sobre descaracterização de barragens, a Receita Federal também dá uma sinalização negativa para a desativação referente a outras indústrias, como a de óleo e gás, segundo Severini. Ele explica que, nesse caso, as despesas também serão inevitavelmente posteriores ao momento de geração de receitas atreladas ao respectivo projeto.
O advogado Rubens Lopes, do escritório WFaria Advogados, também destaca que existem outros tipos de barragens e situações similares, que não estão expressos nessa análise da Receita mas podem ser abrangidos pelo mesmo entendimento. “Na prática, esses gastos [para a desativação] não estão embutidos nos gastos com o que se usa para extrair minério, mas é essencial para a atividade porque há uma obrigação regulatória”, afirma. “E sem o serviço, a barragem pode ceder e causar dano ambiental”, diz o advogado.
“Além disso, sendo essencial e relevante, conforme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), são insumos para fins de créditos de PIS e Cofins”, afirma Lopes REsp nº 1221170).
Por meio de nota, o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) disse que as mineradoras estão custeando estas despesas, com o próprio caixa, “empenhadas em realizar a descaracterização nos prazos acordados com os órgãos responsáveis”. (Colaborou Jéssica Sant’ana)
STF analisará cobrança de contribuição ao INSS sobre vale-refeição e vale-transporte
Data: 02/07/2025
O Supremo Tribunal Federal (STF) poderá provocar uma reviravolta sobre a incidência de contribuição previdenciária nas parcelas descontadas do salário do empregado para pagar o vale-refeição e o vale-transporte. Uma decisão da 2ª Turma surpreendeu o mercado ao declarar que vai analisar a cobrança. Como no ano de 2020 a Corte havia decidido que essa questão é infraconstitucional, a última palavra seria do Superior Tribunal de Justiça (STJ), favorável à tributação.
Nesses benefícios, parte do custo cabe ao trabalhador e outra parcela é bancada pelo empregador. A parte que é descontada do salário do trabalhador integra o salário de contribuição, que é a base de cálculo da contribuição previdenciária paga pela empresa, sob alíquota de 20%. Sobre a parcela que a própria empresa custeia do benefício, por outro lado, não incide contribuição previdenciária, segundo o próprio STF (RE 487410).
No ano de 2022, chegou ao Supremo o processo de uma empresa de engenharia questionando decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) favorável à tributação. Na época, acompanhando o relator, Luiz Fux, os ministros entenderam que a questão é infraconstitucional (ARE 1370843).
No ano passado, o STJ firmou entendimento no sentido de que as parcelas de vale-transporte, vale-refeição e alimentação, e plano de assistência à saúde estão sujeitas à contribuição previdenciária (Tema 1.174).
A decisão do STF, no entanto, de não analisar a questão, foi revertida, por unanimidade, na 2ª Turma da Corte, pouco antes do recesso do Judiciário. O ministro André Mendonça, novo relator do processo, tinha entendido que não era o caso de analisar a ação, por se tratar de questão infraconstitucional.
Dias Toffoli, porém, concordou com o contribuinte que a discussão gira em torno do conceito constitucional de “rendimentos do trabalho”, incluído no artigo 195, inciso I, alínea “a” da Constituição pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998. Ele dispõe que incide contribuição destinada ao custeio da previdência “sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho”.
Mendonça mudou o próprio voto e os demais ministros da 2ª Turma o acompanharam (ARE 1260750).
Toffoli ainda não se manifestou sobre o mérito, que é o pedido do contribuinte para afastar a incidência da contribuição previdenciária. Mas ele entendeu que a Corte deve analisar o alcance da expressão “rendimentos do trabalho” – apesar de já ter julgado a abrangência da folha de salários no ano de 2017 (RE 565160).
“Cabe investigar se é relevante, considerando-se os direitos sociais fundamentais ao transporte e à alimentação do trabalhador, a distinção entre prestações dadas pelo empregador para o trabalho e aquelas dadas pelo trabalho e, nessa seara, se compõem os rendimentos do trabalhador os valores atinentes a tais despesas necessárias para o trabalho”, afirma o ministro em seu voto. Ainda não há data marcada para o julgamento.
O argumento da empresa é que a parcela do vale-refeição e do vale-transporte custeada pelo empregado não consiste em pagamento por serviço prestado. Seu caráter é indenizatório, conforme explicam os advogados Lucas Heck, sócio e fundador do Heck Advogados, e Paulo Coimbra, professor titular de direito tributário da UFMG, que atuaram na causa.
Conforme Alessandro Cardoso, sócio do Rolim Goulart Cardoso Advogados, a discussão é importante para a maioria das grandes empresas no país. “O impacto é significativo, principalmente para a indústria”, diz. “O pagamento dos benefícios tem repercussão mensal, além de o julgamento gerar a expectativa de que a empresa consiga recuperar os valores recolhidos indevidamente no passado, em caso de entendimento favorável.”
Para Carolina Rigon, sócia do ALS Advogados, o Supremo deveria superar o entendimento do STJ. Isso porque ele não levou em conta que a natureza jurídica da verba não muda por causa da mecânica do desconto do salário do empregado. “São valores destinados a garantir a dignidade do trabalhador, e não para remunerá-lo”, defende.
“A decisão do STF é uma oportunidade importante para que seja reafirmado o conceito de remuneração, que deve ser atrelado exclusivamente àquilo que constitui um pagamento pelo trabalho ou pela prestação de serviço”, diz. “Ficam excluídos, assim, os valores pagos para viabilizar o trabalho, com a finalidade de fornecer as condições de deslocamento e subsistência, que são direitos fundamentais”, explica ela.
Para os advogados da causa, é impossível incluir verbas de caráter compensatório, como é o caso do vale-transporte e do vale-refeição, no conceito de remuneração. Isso porque elas servem apenas para auxiliar na garantia de direitos sociais do trabalhador. “Não servem para remunerar o serviço prestado, mas apenas garantir que ele seja prestado”, afirma Lucas Heck.
Além desse recurso que será analisado pela 2ª Turma, chegaram ao Supremo dois outros processos que questionam diretamente o entendimento do STJ favorável ao Fisco. Um deles será analisado pela Corte (RE 1557147), mas o outro foi devolvido ao tribunal de origem (RE 1557148) . A presidência entendeu que a questão já foi analisada no Tema 1.221.
Esses casos, contudo, eram mais restritos que a tese do STJ. Eles trataram da possibilidade de exclusão dos valores relativos ao Imposto de Renda (IR) e contribuição previdenciária do empregado e trabalhador avulsos, retidos na fonte pelo empregador, sobre a base de cálculo da contribuição previdenciária patronal e das destinadas ao SAT/RAT e a terceiros (Sistema S).
Câmara aprova urgência de projeto sobre revisão de incentivos fiscais
Data: 03/07/2025
Depois da derrubada do decreto do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) na semana passada, a Câmara dos Deputados aprovou, nessa quarta-feira (2), o requerimento de urgência para o projeto que trata da revisão de incentivos fiscais. A medida representava um desejo de líderes partidários de demonstrar esforços para o ajuste fiscal.
O pedido foi assinado pelo líder do PP, Doutor Luizinho (RJ), um dos deputados mais próximos do presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB). Motta tem dito que os parlamentares precisam apresentar soluções para a crise econômica e não apenas apontar os erros do governo na política fiscal.
O texto, de autoria do senador Esperidião Amin (PP-SC), trata de critérios, objetivos, metas de desempenho e procedimentos para concessão, alteração e avaliação de benefícios tributários, financeiros e creditícios.
Estabelece que propostas legislativas que criem ou ampliem incentivos tributários devem seguir critérios mínimos, como ter duração máxima de cinco anos, que poderão ser renovados, metas de desempenho econômico, social e ambiental, estimativa de impacto sobre desigualdades regionais e a determinação de monitoramento e avaliação periódica.
Governo vai apresentar projeto próprio
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, diz que o governo apresentará um projeto próprio de revisão de incentivos fiscais após o recesso parlamentar. O secretário-executivo da pasta, Dario Durigan, afirmou na quarta-feira (2)que o governo pretende arrecadar R$ 20 bilhões em 2026 com a proposta.
A votação do requerimento de urgência para o projeto que trata dos incentivos fiscais estava prevista para terça, mas foi adiada após um pedido do deputado Mauro Benevides (PDT-CE). O deputado é autor de outro projeto com o mesmo objeto e defendia que a urgência de seu texto fosse votada em vez da proposta relatada por Amin. Benevides conseguiu reunir assinaturas para o requerimento de urgência para o seu texto, que estaria mais alinhado ao intuito da Fazenda.
Texto de Esperidião Amin não prevê corte
O projeto que teve a urgência aprovada não representa um corte efetivo dos benefícios fiscais,. Apenas determina os critérios para incentivos tributários. Benevides articulou para que a urgência fosse votada apenas no retorno de Motta, que está no exterior, mas o requerimento para o texto – que é o preferido dos partidos de centro – prevaleceu na votação de quarta-feira.
Pela proposta de Benevides, será necessário cortar benefícios. O governo poderá escolher quais setores econômicos terão redução e quais percentuais, desde que o total some, no mínimo, 5% de corte neste ano e mais 5% no ano que vem. Também proíbe a concessão de novos benefícios tributários, financeiros e creditícios e a prorrogação de benefícios exi stentes, se a medida não for acompanhada da redução simultânea de outros benefícios de mesma natureza, em valor equivalente.
Com a urgência do projeto que veio do Senado já aprovada, o texto poderá ser votado diretamente no plenário, e ganha mais chance de ser usado como “carona” e ter outros projetos que tratem do tema apensados.
O presidente da Câmara chegou a ventilar a criação de um grupo de trabalho para discutir os incentivos fiscais e o deputado Cláudio Cajado (PP-BA) era cotado para ser relator. A ideia, no entanto, foi adiada enquanto o texto do governo não chega ao Congresso.
Terceira frente
Para além dos projetos da Fazenda e de Esperidião Amim, a Câmara abriu uma terceira frente de discussão que também trata da revisão de incentivos fiscais. A Comissão de Finanças e Tributação (CFT) instalou nessa quarta-feira a Subcomissão Especial das Isenções Fiscais.
O grupo tem como objetivo dar mais transparência ao uso dos recursos públicos e verificar se as isenções fiscais estão de fato cumprindo sua função social e econômica. A nova instância terá como missão analisar, fiscalizar e propor melhorias no atual sistema de isenções, subsídios e renúncias tributárias concedidas pela União – diante da iniciativa capitaneada pelo Centrão.
“O Brasil não pode continuar abrindo mão de quase R$ 800 bilhões ao ano sem que a sociedade saiba quem se beneficia com isso e o que está sendo perdido em políticas públicas. Vamos passar esse sistema a limpo. É hora de garantir que o dinheiro público sirva à maioria, e não a uma minoria com lobby forte”, defendeu o presidente da comissão, deputado Rogério Correia (PT-MG).
A subcomissão será presidida pelo deputado Ricardo Abrão (União-RJ), relatada por Benevides e terá Fausto Santos Jr. (União-AM), Florentino Neto (PT-PI), Luiz Carlos Hauly (Podemos-PR), Merlong Solano (PT-PI), Pauderney Avelino (União-AM) e Sidney Leite (PSD-AM) como membros.
STJ julgará exclusão de ICMS na base de crédito de PIS/Cofins como repetitivo
Data: 06/07/2025
A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, afetar ao rito dos recursos repetitivos a discussão sobre a possibilidade de exclusão do ICMS da base de cálculo dos créditos de PIS/Cofins na aquisição de produtos. O julgamento ainda não teve Tema cadastrado e não há data prevista para ocorrer. O relator dos repetitivos é o ministro Paulo Sérgio Domingues.
A discussão teve início com a edição da Lei 14.592/2023, que passou a vedar o creditamento de PIS e Cofins sobre o ICMS não recuperável nas aquisições. Tratou-se de uma mudança motivada pelo entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) no Tema 69 (Tese do Século), que retirou o ICMS da base de cálculo das contribuições na saída de mercadorias.
Recentemente, o STF decidiu não reconhecer a repercussão geral de um recurso que discutia o tema. O relator, ministro Luís Roberto Barroso, entendeu que a tese tem natureza infraconstitucional, por depender da interpretação de normas como a MP 1.159/2023 e as Leis 14.592/2023, 10.637/2002 e 10.833/2003.
Os contribuintes argumentam, no STJ, que o julgamento do Supremo se restringiu às operações de venda e, por isso, não pode ser automaticamente estendido às aquisições. Alegam que, para o comprador, o ICMS destacado na nota fiscal representa um custo efetivo, razão pela qual sua inclusão na base de cálculo dos créditos de PIS e Cofins deve ser mantida em respeito ao princípio da não cumulatividade.
A jurisprudência da Corte nesse sentido é desfavorável aos contribuintes, embora os colegiados tenham se pronunciado poucas vezes sobre o tema. O STJ decidiu no Tema 1231 que o ICMS-ST não gera direito a crédito de PIS/Cofins.
Para o advogado tributarista Carlos Amorim, sócio do Martinelli Advogados, ambos os temas precisam ser lidos conjuntamente, especialmente em razão do vínculo com o Tema 69 do STF. Segundo ele, a Lei 14.592/2023, que deu origem à atual discussão no STJ, foi além do que decidiu o Supremo ao excluir o ICMS não apenas da base de cálculo do débito das contribuições, mas também da base de crédito.
Amorim acredita que o raciocínio adotado no Tema 1.231 pode “ecoar” na discussão sobre o ICMS ordinário. Ainda assim, ressalta que há diferenças relevantes, como a definição do que compõe o “valor do item” para fins de creditamento e o fato de que o ICMS próprio, destacado na nota, representa custo de aquisição.
Os recursos que versam sobre a discussão tramitam como REsps 2.150.097, 2.150.894 e 2.151.146.
Ministros do STJ julgarão em repetitivo quando incide IRPJ e CSLL sobre repetição de indébito
Data: 07/07/2025
Os ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afetaram, sob o rito dos repetitivos, a discussão sobre o momento de incidência do IRPJ e da CSLL em valores decorrentes de repetição de indébito tributário ou de compensações reconhecidas judicialmente com trânsito em julgado. A Corte vai definir o momento em que é configurada a disponibilidade jurídica da renda, especialmente nos casos em que os créditos ainda são considerados ilíquidos. A relatoria é do ministro Teodoro Silva Santos, e o julgamento ainda não tem data prevista.
Com a afetação, o STJ determinou a suspensão de todos os processos, individuais ou coletivos, que tratem da mesma matéria e que estejam em tramitação na Corte ou com recurso especial ou agravo interposto na segunda instância.
Advogados ouvidos pelo JOTA afirmam que a discussão de afetação não deveria definir a disponibilidade jurídica de renda, mas sim a disponibilidade econômica do ganho tributário.
A advogada Leilaine Pereira, sócia do Martinelli Advogados, avalia que há um descompasso entre esses dois conceitos, que se acentua nos casos envolvendo precatórios, sobretudo no intervalo entre o reconhecimento judicial do direito e a expedição ou o pagamento do crédito.
Para ela, o STJ não precisa definir o conceito de disponibilidade jurídica, uma vez que isso é consolidado no reconhecimento do direito, mas enfrentar o desencontro prático entre o momento econômico e a exigência fiscal.
O caso será julgado no REsp 2.153.492, no Resp 2.153.547 e outros (Tema 1362).
Empresas querem novo prazo para escolha de regime tributário
Data: 07/07/2025
Confederações representantes do setor produtivo pediram ao Ministério da Fazenda que adie a implantação de uma mudança no sistema de abertura de empresas, prevista para o próximo dia 27. O principal ponto questionado é a exigência de escolha do regime tributário no momento do registro. Hoje, isso pode ser feito em até 30 dias após a obtenção do CNPJ, o que, alegam, dá mais tempo para um planejamento estratégico.
O ofício é assinado pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização (CNSeg), Confederação Nacional de Saúde (CNSaúde), Confederação Nacional das Instituições Financeiras (Fin), Confederação Nacional das Cooperativas (CNCoop) e Confederação Nacional da Indústria (CNI).
As confederações apontam riscos operacionais, jurídicos e econômicos que podem impactar o ambiente de negócios, especialmente para micro e pequenas empresas. Isso por causa da exigência da definição do regime tributário no ato de registro.
Além disso, a concessão do CNPJ dependerá do preenchimento de novos questionários ainda não totalmente divulgados. Por isso, as confederações pontuam que o atual prazo médio de até dois dias úteis para a abertura de empresas poderá aumentar. As confederações destacam ainda que as juntas comerciais não estariam prontas para adaptar os próprios sistemas até o dia 27.
As alterações constam da Nota Técnica Cocad da Receita nº 181, de 2025. O diretor da CNC Daniel Coelho afirma que essa nota foi uma surpresa para o mercado porque não foi discutida com as entidades. “Essa mudança, se acontecer, vai afetar qualquer tipo de empresa no processo de abertura”, afirma.
Para ele, a retirada da emissão de CNPJ do fluxo simplificado tornará esse procedimento mais demorado. “Será um processo à parte, depois de registrado o contrato social terei que pedir à Receita o CNPJ e, depois, pedir as inscrições locais”, diz. “Não existe nenhum artigo [da reforma tributária], nem nas entrelinhas, que justifique essa mudança”.
Segundo Renan Luiz Silva, superintendente da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), hoje há um processo integrado e rápido na legalização e abertura de empresas em que a junta centraliza as informações e o trâmite se dá dentro de portais digitais, o que otimiza e reduz prazos. “Micro e pequenos empresários terão que contratar contadores ou advogados”, afirma. “Às vezes, a empresa é aberta para fazer um contrato de locação com o CNPJ e depois iniciar a operação. Agora isso fica um pouco prejudicado”, acrescenta.
A Federação Nacional das Juntas Comerciais (Fenaju) também critica a mudança. Em nota, afirma que a medida é “decisão unilateral da Receita” em desprestígio ao deliberado no colegiado interfederativo. Por isso, a medida “seria uma possível ofensa ao pacto federativo”. “Isso significa um grande retrocesso no registro de empresas, retornando para mais de uma década atrás”, diz.
“Todas as novas empresas mercantis que passarão pela junta serão afetadas. É mais um passo, pequeno que seja, de desincentivo ao empreendedorismo e à criação de novas empresas”, afirma Marcio Alabarce, sócio tributarista do Canedo, Costa, Pereira e Alabarce Advogados.
O advogado pontua que, em leilões de concessão pública, por exemplo, quem apresenta a proposta precisa constituir uma Sociedade de Propósito Específico em pouco tempo, e faz diferença se a abertura ocorrerá em dois dias ou um pouco mais. “Também não entendi por que a Receita precisa, neste momento, da informação do regime tributário”, afirmou. A antecipação da opção formal pelo regime tributário afetará as empresas, segundo Alabarce.
Em nota, a Receita negou que as novas regras atrapalhem a abertura de empresas e o ambiente de negócios. “O empreendedor não terá que iniciar um novo procedimento moroso para a obtenção do CNPJ após o registro societário. O fluxo continuará sendo digital e integrado, mantendo a celeridade já alcançada”, disse. “A evolução representa avanços na simplificação de registro e legalização de pessoas jurídicas por sistema modernizado, com redução de prazos para a operação da empresa e mantendo a integridade das informações cadastrais” (Colaborou Guilherme Pimenta).
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STF mantém preferência de honorários sobre créditos tributários
Data: 02/07/2025
O STF decidiu manter, por unanimidade, a validade do artigo 85, § 14, do CPC, que garante a preferência dos honorários advocatícios – inclusive contratuais – sobre créditos tributários. A decisão foi tomada no julgamento de segundos embargos de declaração no RE 1.326.559, com repercussão geral reconhecida no Tema 1.220, e foi concluída em sessão virtual encerrada em 30 de junho. Os ministros entenderam que não havia omissão, obscuridade ou contradição a ser sanada no acórdão anterior.
Relator do caso, o ministro Dias Toffoli rejeitou os embargos apresentados pela União. Em seu voto, afirmou que os honorários advocatícios têm natureza alimentar e devem, por isso, gozar da mesma preferência que os créditos trabalhistas, conforme previsto no artigo 186 do CTN – Código Tributário Nacional. Segundo o relator, essa natureza justifica a equiparação entre as categorias e legitima a prevalência dos honorários mesmo frente à dívida tributária da parte vencida no processo.
Toffoli também destacou que a norma questionada (art. 85, § 14, do CPC) não usurpa competência legislativa atribuída à lei complementar, pois apenas reafirma o entendimento já existente na jurisprudência, especialmente do STJ, sobre a precedência dos créditos de natureza alimentar. O ministro ressaltou que essa preferência se aplica não apenas aos honorários de sucumbência, mas também aos honorários contratuais, desde que demonstrada a sua natureza alimentar.
A decisão não alcança os casos de falência, nos quais há regras específicas para a ordem de pagamento de créditos, conforme ressalvado pelo próprio relator. Toffoli mencionou que a legislação tributária admite que a lei estabeleça limites e condições diferentes para essas situações, o que não se confunde com o caso julgado.
Por fim, o ministro assinalou que, se desejasse, a própria União poderia propor alterações legislativas para enquadrar os honorários advocatícios de forma mais restrita, como créditos de natureza trabalhista apenas para advogados empregados sob a CLT, mas isso dependeria de iniciativa do legislador ordinário.
Com a rejeição dos embargos, permanece o entendimento firmado pelo STF no julgamento de mérito, que assegura a prevalência dos honorários advocatícios, inclusive contratuais, sobre créditos tributários, em processos de execução e cumprimento de sentença. O precedente tem aplicação obrigatória em todos os casos similares no país.
O Conselho Federal da OAB, que atuou como amicus curiae no processo, comemorou a decisão: “ao manter o reconhecimento da natureza alimentar dos honorários advocatícios e sua precedência em relação aos créditos tributários, o Supremo reafirma a dignidade da profissão e o papel essencial da advocacia para a Justiça. Essa conquista é fruto de uma luta histórica da OAB em defesa dos direitos dos advogados e advogadas brasileiros, e consolida os honorários como instrumento de subsistência e autonomia profissional”, afirmou o presidente nacional da OAB, Beto Simonetti.
Processo: RE 1.326.559
STJ retoma julgamento sobre parcelamento especial
Data: 03/07/2025
Pouco antes do recesso do Judiciário, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) retomou o julgamento sobre o prazo para apresentação de documentação para adesão ao Programa Especial de Regularização Tributária (Pert), um parcelamento especial para dívidas tributárias vencidas até 30 de abril de 2017. O julgamento da 2ª Turma da Corte interessa às empresas que perderam este prazo e, por causa disso, não usaram os benefícios do programa.
Ao votar, o relator, ministro Francisco Falcão mencionou que a repercussão do julgamento poderia chegar a R$ 18 bilhões, que foi o total do montante arrecadado pelo Pert na época. Mas, após dois votos a favor do Fisco e um do contribuinte, um pedido de vista suspendeu o julgamento. Faltam dois votos.
O caso concreto envolve a distribuidora de energia EDP São Paulo, que renegociou R$ 18 milhões em dívidas de PIS e Cofins, em 2018, por meio do Pert. O programa foi criado pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) para oferecer parcelamento especial para pessoas físicas e jurídicas com dívidas com a própria PGFN ou com a Receita Federal (Lei nº 13.496/2017).
A EDP aderiu ao programa, mas perdeu o prazo para apresentar as Declarações de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCFTs). Isso ocorreu, segundo a empresa, porque a Instrução Normativa da Receita Federal nº 1.855, publicada no Diário Oficial da União em 10 de dezembro de 2018, instituiu como prazo final de apresentação desses documentos o dia 7 de dezembro de 2018 – ou seja, antes mesmo da própria publicação da norma.
A empresa pediu à Justiça que obrigasse a PGFN a analisar novamente o requerimento administrativo de revisão da consolidação do Pert, mas o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) negou. A EDP, então, levou o caso ao STJ (REsp 2084830).
Na 2ª Turma, o relator, ministro Francisco Falcão, votou contra o pedido da empresa. Segundo Falcão, a Instrução Normativa 1855 “não impôs nova condição para o parcelamento, tampouco limitou direitos”.
O ministro afirmou que o pedido da EDP seria razoável se as declarações tivessem sido apresentadas entre o dia 7 de dezembro (prazo final determinado pela norma) e o dia 10 (data em que ela foi publicada), mas os documentos só foram protocolados no dia 14. Ele foi acompanhado pela ministra Maria Thereza de Assis Moura.
Já para o ministro Afrânio Vilela, a decisão de segunda instância não enfrentou todos os argumentos trazidos no processo que poderiam influenciar na decisão final. Ele destacou que não foram analisadas as possíveis violações ao Código Tributário Nacional (CTN), do Decreto 4.657, do artigo 8º do Código de Processo Civil (CPC) e ao artigo 1º da lei que instituiu o Pert (Lei 13.496).
Vilela ressaltou também que, embora concorde com a fundamentação de Falcão de que o Judiciário não deve afrontar a autonomia da autoridade tributária, a previsão trazida pela Instrução Normativa da Receita teria afrontado o CTN (artigos 100 e 106).
Além disso, segundo ele, só pode retroagir a norma que beneficie o contribuinte, mas essa criava obrigação. “O artigo 11 da IN 1.855, publicada no DOU em 10 de dezembro de 2018, ao criar a exigência de transmissão de documentos originais ou retificadores, até 7 de dezembro de 2018, ou seja, até três dias antes do seu nascimento para o mundo jurídico, atenta contra todas as legislações que foram mencionadas”, afirmou Vilela. Após o voto, o ministro Teodoro Silva Santos pediu vista do processo.
Para tributaristas, a linha de raciocínio apresentada por Afrânio Vilela é a que traz mais segurança e racionalidade. Pedro Siqueira, do Bichara Advogados, defendeu a empresa no processo e afirmou que a questão é bastante simples. “O que a defesa diz é que não tem como cumprir um prazo que já veio descumprido, retroativo”, resume.
Siqueira destaca também que a análise do caso parece ter se baseado na possibilidade do impacto econômico bilionário, segundo citou o relator ao votar. Mas ele lembra que a causa em jogo, da EDP São Paulo, trata apenas de R$ 18 milhões, que inclusive estão sendo pagos pela empresa desde 2018.
A EDP Espírito Santo também levou a questão ao Judiciário e obteve decisão favorável, transitada em julgado, no TRF da 2ª Região. Neste processo, a 4ª Turma Especializada entendeu que “o dispositivo em questão criou obrigação não prevista em lei” e “prejudicou o planejamento tributário dos contribuintes que haviam aderido ao programa, criando obrigação nova e de modo que não seria mais possível cumpri-la” (processo nº 5028117-52.2020.4.02.5001).
Fabrício Parzanese, sócio da área tributária do Velloza Advogados, também entende que não é razoável negar o parcelamento de dívidas tributárias por uma questão de data retroativa. “Os programas de negociação de débitos tributários são uma conquista que não pode ser relativizada por excesso de formalismo”, opina.
“A negativa vai na contramão do que se tem discutido no âmbito do Direito Tributário, que é o aprimoramento das relações entre o Fisco e o contribuinte. Esse tipo de postura fragiliza a confiança do contribuinte para buscar o Fisco e confessar dívidas buscando a renegociação”, afirma
Justiça estende prazo para empresa utilizar benefício fiscal do Perse
Data: 03/07/2025
Uma nova decisão da Justiça Federal de São Paulo manteve uma empresa do segmento de hotelaria no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) até o fim de maio deste ano. O entendimento garante mais dois meses de alíquota zero de Imposto e Renda (IRPJ), CSLL, PIS e Cofins. A Receita Federal determinou que o programa acabou em março, com o atingimento do teto de R$ 15 bilhões de renúncia fiscal.
Essa é a primeira decisão de segunda instância, segundo tributaristas, a declarar que a União não comprovou o alcance do limite orçamentário no mês de março. A desembargadora relatora do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), Monica Nobre, considerou que a Receita só tornou pública, em maio, a explicação sobre o total gasto com o programa.
O Perse foi criado pela Lei nº 14.148/2021 para ajudar empresas de eventos e turismo após a crise gerada pela pandemia da covid-19. Ele zerou as alíquotas de tributos federais até março de 2027. Mas o Poder Executivo foi restringindo sua aplicabilidade, dizem especialistas.
A alteração mais recente veio com a Lei nº 14.589, de 2024. A norma impôs um fim aos incentivos fiscais quando o teto de R$ 15 bilhões fosse atingido. Em março deste ano, a Receita informou, por meio do Ato Declaratório Executivo nº 2, que esse limite foi alcançado. No relatório, o órgão diz que foi usado 85,6% desse montante até fevereiro de 2025 – o equivalente a uma renúncia fiscal de R$ 12,8 bilhões.
Para contribuintes, o governo não havia comprovado que o teto foi alcançado. Isso é inclusive questionado pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) em ação direta de inconstitucionalidade a ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Para a entidade, o Perse deve durar, ao menos, até o ano de 2026 (ADI 7817).
Na decisão do TRF-3, a relatora entendeu que a extinção do Perse deve ocorrer a partir de 1º de junho, pois é o mês seguinte após a comprovação de que o teto foi atingido. A demonstração veio a partir de um relatório do Fisco feito com dados extraídos em 21 de maio, do Painel da Declaração de Incentivos, Renúncias, Benefícios e Imunidades.
“Ainda que a União tenha comprovado que em março de 2025 atingiu R$ 15 bilhões, a informação somente se tornou pública em 21 de maio de 2025”, diz. Como a legislação prevê que ele será extinto no mês seguinte à demonstração de que o teto foi atingido, “o benefício deverá ser cessado a partir de 1º de junho de 2025”, disse (processo nº 5012051-59.2025.4.03.0000).
Na resposta a um pedido feito pelo Valor à Receita sobre o assunto, com base na Lei de Acesso à Informação (LAI), o Fisco disse que isso foi demonstrado no Congresso Nacional, em audiência pública feita em 12 março de 2025. Naquela data, foram extraídos dados do mesmo mês, “com valores efetivamente declarados para as competências abril/2024 a janeiro/2025 e valores fruídos, porém ainda não completamente declarados, relativos às competências fevereiro/2025 e março/2025”.
A Receita reconhece que “existem decisões judiciais nos mais variados estágios de defesa que sentenciam contra a RFB no sentido de garantir a fruição do benefício tributário. Algumas, inclusive, pelos meses vindouros”. Porém, afirma que não há como estimar o impacto dessas decisões nas contas públicas. “Mas, sem sombra de dúvidas, haverá aumento do gasto tributário para além dos montantes apresentados, caso sejam mantidas”.
A resposta foi dada pela Delegacia da Receita Federal em Sorocaba/SP, gestora das equipes nacionais de benefícios fiscais.
A magistrada do TRF-3, contudo, não acolheu a principal tese do contribuinte, de que o Perse é equiparável à isenção tributária. Na prática, isso permitiria a aplicação da Súmula 544 do STF e artigo 178 do Código Tributário Nacional (CTN), no sentido de que a alíquota zero do programa não poderia ser livremente suprimida, nem por outra lei.
A desembargadora Monica Nobre também ponderou que a revogação do Perse não viola os princípios da confiança e da segurança jurídica. “Considerando que a condição estava prevista na referida lei, publicada em maio de 2024, e todos tinham ciência do limite orçamentário estabelecido, não verifico afronta”.
A tributarista Larissa Di Stefano, coordenadora de contencioso tributário do VBD Advogados, que atuou no caso, diz que vai recorrer para tentar manter a empresa no benefício até o ano de 2027. “Mas a decisão é um fôlego para a empresa, porque a União informou que foi atingido o teto de R$ 15 bilhões sem fazer a comprovação”, afirma.
Larissa reforça que o contribuinte se planejou para não pagar impostos em 2025, deixando de optar pelo Simples Nacional para usufruir do Perse. “A revogação repentina foi um baque e, agora, ela nem consegue fazer a opção pelo Simples porque passou o prazo. Mas os dois meses deram fôlego para administrar as contas”, diz.
Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que empresas do Simples, que têm faturamento de até R$ 4 milhões, não podem fazer parte do Perse. A Corte também determinou a necessidade de inscrição no Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos (Cadastur). Essas foram as teses julgadas pelos ministros sobre o programa até então.
Para Alessandro Ragazzi, do Ragazzi Advocacia, a decisão do TRF-3 destoa da maioria dos tribunais, que têm reconhecido a anterioridade. “É uma vitória técnica, mas ainda distante da solução ideal para os contribuintes que esperam o cumprimento integral da promessa de alíquota zero por 60 meses, como previsto na Lei do Perse”, diz o tributarista.
Ragazzi obteve, em junho, sentença favorável na 11ª Vara Federal Cível de Belo Horizonte para manter associados da União Brasileira de Feiras e Eventos de Negócios (Ubrafe) no programa. Ele tem cerca de 50 casos sobre a matéria e em seis deles houve decisão a favor da empresa (processo nº 6019200-54.2025.4.06.3800).
O diretor da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) de São Paulo, Percival Maricato, diz que as decisões favoráveis às empresas para mantê-las no Perse são minoria. “A esperança fica para o STJ, onde poderá ser decidido se algumas das teses que defendem o benefício serão procedentes”, diz. No Brasil, cerca de 25% dos bares e restaurantes ainda estão no negativo, completa ele.
Na visão de Maricato, os incentivos fiscais do programa deveriam ser revisitados pela Receita, para verificar quais contribuintes do setor de fato sofreram prejuízos durante a pandemia. “Precisaria ser feita uma verificação mais precisa de quem foi beneficiado indevidamente e fazer a redistribuição do benefício”, defende Maricato, citando companhias de aluguel de imóveis e entrega de comida.
Segundo o diretor, a legislação não pode ser revogada. “Não pode haver surpresa para o empresário que se previne e, de repente, o planejamento vai para o espaço porque aparece uma legislação que interrompe ou altera o previsto”.
Em nota, a CNC disse que entrou com a ação no STF “a fim de evitar a abrupta extinção do Perse” e que “segue na luta para obter uma liminar favorável”. Destaca ainda que informará sobre a decisão do TRF-3 aos ministros, “como elemento adicional do processo”.
Também em nota, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) disse “ser plenamente legal o encerramento do Perse pelo atingimento do custo total de R$ 15 bilhões, por decorrer de previsão expressa contida no artigo 4º-A da Lei nº 14.148/2021, incluído pela Lei nº 14.859/2024”. E que a jurisprudência majoritária sobre o fim do programa é favorável à União. “Diante de liminares desfavoráveis, a Fazenda informa que irá interpor os recursos cabíveis e confia na reversão das decisões judiciais”, disse.
Decreto abre brecha para ações de restituição do IOF pago com taxas maiores
Data: 03/07/2025
Enquanto o vaivém de normas recentes relativas ao Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) é alvo de ações no Supremo Tribunal Federal, uma discussão derivada pode causar ainda mais judicialização.
O tema levado ao STF é a validade dos decretos do Poder Executivo que aumentaram as alíquotas do IOF e do decreto legislativo subsequente que derrubou esse reajuste. Enquanto os ministros não analisam o tema, continua em vigor o decreto legislativo. Mas tributaristas apontam que quem pagou o IOF durante a curta vigência dos decretos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ainda pode acionar a Justiça para pedir restituição, pois os parlamentares não trataram desse período.
O governo aumentou as alíquotas do IOF por meio dos Decretos 12.466/2025, 12.467/2025 e 12.499/2025, publicados entre 22 de maio e 11 de junho. Eles foram anulados no dia 27 de junho, quando foi publicado o Decreto Legislativo 176/2025.
Restituição no radar
Embora os decretos presidenciais tenham produzido efeitos até 26 de junho, a tributarista Fernanda Calazans, sócia do Velloza Advogados, defende a possibilidade de contribuintes recorrerem ao Judiciário para reaver o imposto pago antes dessa data com as alíquotas maiores.
Segundo ela, a promulgação do decreto legislativo é “um importante elemento argumentativo, na medida em que foi fundamentado por excesso do poder regulamentar do Executivo”.
De acordo com o tributarista Julio Cesar Vieira Gomes, ex-secretário da Receita Federal e ex-conselheiro do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), o decreto legislativo produz efeitos a partir de 27 de junho. “Portanto, para reaver o que fora pago a maior, o interessado deve comprovar a ilegalidade da cobrança por meio de ação judicial própria.”
Por outro lado, Calazans vê uma tendência, na prática, de que os contribuintes ainda não acionem o Judiciário, para aguardar uma decisão do Supremo sobre o tema.
Três ações sobre o IOF chegaram ao STF. O Partido Liberal (PL) questionou a validade de dois dos decretos de Lula quando eles ainda estavam em vigor. A alegação foi de desvio de finalidade do imposto.
Mais tarde, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e o próprio governo federal contestaram o decreto legislativo, com o argumento de que o IOF é de competência exclusiva do Executivo.
O decreto legislativo não diz quais seriam as alíquotas aplicáveis no período anterior à sua promulgação. Victor Hugo Scandalo Rocha e Luiz Renato Hauly, respectivamente diretor jurídico e diretor econômico do Movimento Destrava Brasil, explicam que, conforme a Constituição, o Congresso só precisa incluir uma previsão do tipo se rejeitar uma medida provisória. Não há essa obrigação com relação à derrubada de decretos presidenciais.
Para eles, seria válido concluir, portanto, que, se os parlamentares nada disseram sobre o período anterior ao decreto legislativo, “os efeitos anteriormente produzidos” pelos decretos presidenciais permaneceriam válidos. Mas eles ressaltam que a anulação dessas normas foi justificada pela suposta extrapolação do poder regulamentar do Executivo: “Ou seja, sua motivação é uma inconstitucionalidade.”
A inconstitucionalidade, segundo eles, é “um vício gravíssimo no ordenamento jurídico”. Por isso, “permitir a manutenção dos seus efeitos deveria ser situação excepcional”. Assim, para Rocha e Hauly, é possível interpretar que a derrubada de decretos do Executivo por meio de decreto legislativo “tende a anular, automaticamente, os efeitos já produzidos, exceto se dispor em contrário (o que não o fez no caso concreto)”.
Mesmo assim, os advogados entendem que só haverá certeza quanto a isso “quando da provável análise a ser feita pelo Poder Judiciário”. Isso passa antes pela discussão de constitucionalidade dos decretos (tanto os de Lula quanto o do Legislativo).
Sem previsão expressa
Para Igor Machado, do escritório Meirelles Costa Advogados, “há possibilidade de judicialização visando à restituição dos valores pagos no período” em que os decretos presidenciais estiveram em vigor.
Como explica o advogado, “não há previsão expressa” na Constituição ou na legislação que invalide automaticamente um decreto desde sua origem quando ele é derrubado pelo Legislativo.
Na prática, a tendência é que “o Executivo e a administração tributária sustentem a ausência de efeitos retroativos, o que poderá ensejar a judicialização da matéria por contribuintes que se sintam prejudicados pela ausência de definição normativa quanto à devolução dos valores recolhidos sob a vigência do decreto sustado”.
Segundo Machado, quando os decretos de Lula entraram em vigor, já houve um movimento de contribuintes que se sentiram prejudicados pelo aumento da carga tributária e acionaram o Judiciário.
Na sua visão, como o tema ainda não foi julgado no STF, a tendência, na verdade, “é que o movimento de judicialização não apenas persista, como também se intensifique”, voltada a esclarecer pontos ainda indefinidos. A “possibilidade de produção de efeitos do decreto presidencial no período compreendido entre sua edição e a posterior sustação pelo Congresso” é um deles.
Já João Colussi, sócio de Tributário do Mattos Filho, afirma que, “nos termos interpretados pela doutrina”, em regra, um decreto legislativo que derruba um decreto do Executivo produz efeitos retroativos. Isto é, o decreto anulado “perde validade desde sua edição, como se nunca tivesse existido, afetando todas as relações jurídicas dele decorrentes”.
A consequência disso, segundo ele, é que os valores pagos com as alíquotas maiores se tornaram indevidos. Por isso, “há possibilidade de judicialização visando a restituição de valores pagos no período em que vigorou a majoração das alíquotas de IOF, em especial se houver uma resistência por parte das autoridades fiscais”.
Barreiras
João Pedro Ramos Garcia, advogado no Ballstaedt Gasparino Advogados, concorda que “é viável ajuizar ação para reaver o IOF pago” nas alíquotas estabelecidas a partir de maio.
O Código Tributário Nacional (CTN) prevê o direito de restituição em caso de pagamento de tributo “maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido”.
Além disso, a Constituição só permite que o Executivo ajuste alíquotas do IOF se forem “atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei”. O Congresso considerou que esse requisito não foi preenchido.
Por outro lado, Garcia enxerga algumas barreiras aos contribuintes que pretendam pedir a restituição. A primeira delas é que o próprio decreto legislativo “não previu retroatividade”. Ou seja, em tese, as cobranças feitas até a promulgação da norma são válidas e o contribuinte “deve provar que suportou o ônus econômico ou obter cessão de quem o suportou”.
O próprio governo pode argumentar que o Congresso “apenas revogou a eficácia futura dos decretos, sem lhes retirar validade pretérita”. O advogado aponta que a jurisprudência do STF “ainda é escassa sobre devolução nessa hipótese”.
“Em suma, o decreto legislativo produz efeitos apenas para o futuro, mas há tese, ainda incerta, para buscar devolução dos valores pagos”, conclui.
Crédito tributário pode ser contestado por meio de mandado de segurança
Data: 03/07/2025
Diante da plausibilidade do direito e do risco de dano irreparável pela demora do processo, é admissível o uso de mandado de segurança para questionar créditos tributários.
Com esse entendimento, o juiz José Valterson de Lima, da 13ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Maranhão, concedeu liminar autorizando uma empresa do setor atacadista de materiais de construção a fazer o depósito judicial da diferença entre os valores do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins) cobrados pela Receita Federal e a quantia que considera devida.
De acordo com o processo, a empresa questiona a exigência da inclusão dos tributos em suas próprias bases de cálculo. Ela optou pelo depósito judicial com base no artigo 151, inciso II, do Código Tributário Nacional (Lei 5.172/1966). Esse dispositivo assegura a suspensão da exigibilidade de crédito tributário quando seu valor é depositado em juízo.
Em sua decisão, o juiz argumentou que o Tribunal Regional Federal da 1ª Região tem reconhecido o uso de mandados de segurança como via judicial para a impugnação de créditos tributários e assegurado a possibilidade de depósitos.
Em suas palavras, a medida tem como objetivo “elidir os efeitos deletérios de eventual inscrição em dívida ativa e/ou cobrança forçada do montante”.
Os advogados Gabriel Pinheiro Corrêa Costa e Lucas Soares Sousa, do escritório Costa e Costa Associados, representaram a empresa.
Processo 1025731-94.2025.4.01.3700
STF suspende decretos sobre IOF e marca audiência de conciliação
Data: 04/07/2025
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu os efeitos de três decretos presidenciais que aumentavam as alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), bem como do decreto legislativo que havia sustado esses atos do Executivo. Na decisão, o relator também determinou a realização de uma audiência de conciliação para o dia 15 de julho, às 15h. A liminar foi concedida no âmbito das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 7827 e 7839 e da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 96.
Serão intimados a participar da audiência as Presidências da República, do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, a Procuradoria-Geral da República, a Advocacia-Geral da União e as partes autoras das ações.
Segundo o ministro, há “fortes argumentos” que justificam a suspensão da eficácia dos decretos, especialmente porque o embate entre Executivo e Legislativo, “com sucessivas e reiteradas declarações antagônicas, contraria fortemente o artigo 2º da Constituição Federal, que, mais do que determinar a independência dos Poderes, exige a harmonia entre eles”.
Autores das ações
A ADI 7839 foi proposta pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) visando à derrubada do decreto legislativo, e, na ADI 7827, o Partido Liberal (PL) contesta o aumento do IOF. Já na ADC 96, o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, solicitou ao STF a confirmação da validade dos decretos presidenciais.
Finalidade regulatória
O ministro Alexandre de Moraes explicou que o IOF tem como principal função a regulação do mercado financeiro e da política monetária, tendo, assim, natureza extrafiscal. Segundo ele, caso fique demonstrado que o Poder Executivo utilizou esse instrumento apenas para fins arrecadatórios, haverá desvio de finalidade, o que autoriza o Poder Judiciário a verificar a validade do ato.
Em análise preliminar, o ministro considerou plausível a alegação de que os decretos presidenciais podem ter extrapolado a natureza extrafiscal e regulatória do IOF, pois propõem aumento superior a 60% na arrecadação desse tributo.
Decreto autônomo
Em relação ao decreto legislativo, o ministro destacou que a sustação, pelo Congresso, de atos do Executivo deve ser excepcional e incidir apenas sobre o ato normativo que extrapole o poder regulamentar. No caso, o Legislativo sustou decretos presidenciais sobre a majoração do IOF, mas, conforme a previsão constitucional, “o decreto legislativo não admite que seja operado pelo Congresso Nacional contra decretos autônomos, que não estejam regulamentando lei editada pelo Poder Legislativo”.
Por fim, o ministro enfatizou que sua decisão, tomada em ações propostas tanto pela chefia do Poder Executivo quanto pelo maior partido de oposição e por partido da base governista, demonstra a importância da atuação do STF no caso, diante da necessidade de exercer sua competência jurisdicional “para resolver os graves conflitos entre os demais Poderes da República pautados na interpretação do texto constitucional”.
Reforma Tributária: Receita Federal publica tabela de créditos presumidos de IBS e CBS
Data: 07/07/2025
A Receita Federal divulgou, na última quinta-feira (4), a tabela oficial de créditos presumidos do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). O documento, publicado no Portal Nacional da Nota Fiscal Eletrônica (NF-e), integra as medidas de transição previstas pela Reforma Tributária do consumo.
A tabela tem como objetivo orientar os contribuintes durante o período de adaptação ao novo modelo tributário, conforme estabelece a Emenda Constitucional nº 132/2023. A vigência da tabela se inicia em 23 de junho de 2025.
Nova tabela detalha hipóteses de crédito presumido
Segundo o arquivo disponibilizado, a tabela contém 13 códigos distintos de créditos presumidos aplicáveis ao IBS e à CBS, vinculados a diferentes artigos da Lei Complementar nº 214/2025. Entre os principais casos listados, destacam-se:
Aquisição de bens e serviços para revenda;
Serviços de transporte interestadual e intermunicipal;
Compra de resíduos recicláveis por empresas incentivadas;
Projetos do regime automotivo nacional;
Indústrias com incentivos regionais ou de inovação tecnológica.
Cada linha da tabela informa se o crédito poderá ser apropriado por meio de Nota Fiscal eletrônica, evento fiscal, ou outros documentos exigidos pelo novo modelo.
Aplicação depende da atividade e enquadramento da empresa
Os créditos presumidos de IBS e CBS não serão automáticos. A apropriação dependerá do tipo de operação, da finalidade do bem ou serviço adquirido e do enquadramento do contribuinte em regimes especiais. Em alguns casos, a concessão exige habilitação prévia em programas setoriais.
A coluna “IndCredPresCBS” indica se o crédito é aplicável à CBS, enquanto “IndCredPresIBS” revela se o mesmo benefício se estende ao IBS. Também estão informadas as alíquotas previstas, que podem ser fixas, efetivas (calculadas com base na operação), ou atualizadas anualmente.
Transição entre regimes exige atenção dos contribuintes
A disponibilização dessa tabela é um dos primeiros passos práticos para operacionalização do novo sistema tributário baseado no Imposto sobre Valor Agregado (IVA dual), que substituirá cinco tributos atuais — PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS.
Conforme a EC 132/2023, a transição será feita em fases, com a CBS entrando em vigor em 2026 e o IBS sendo implementado gradualmente até 2032. Durante esse intervalo, os contribuintes precisarão conviver com dois sistemas tributários paralelos: o antigo e o novo.
Contadores terão papel estratégico na adaptação ao novo modelo
A publicação da tabela de créditos presumidos reforça a necessidade de atualização e planejamento por parte de contadores, consultores fiscais e departamentos tributários. O correto aproveitamento dos créditos dependerá do cruzamento entre legislação, parametrização dos sistemas fiscais e escrituração detalhada.
“Trata-se de um instrumento técnico que será essencial para garantir conformidade tributária no novo cenário. O planejamento fiscal precisará considerar se a empresa tem direito ao crédito, como deve ser escriturado e em que momento pode ser compensado”, avalia Charles Gularte, vice-presidente da Contabilizei.
Além disso, o novo modelo exigirá reavaliação dos sistemas ERP e de emissão de documentos fiscais, já que a apropriação de crédito pode ocorrer por meio de eventos específicos vinculados às NF-es. Empresas que não adaptarem seus sistemas em tempo hábil poderão enfrentar autuações ou perda de benefícios fiscais.
Impacto direto no planejamento tributário
A CBS e o IBS formarão a espinha dorsal do novo sistema de arrecadação do consumo. Ambos se baseiam nos princípios da não cumulatividade plena e da tributação no destino. A CBS será federal, enquanto o IBS terá gestão compartilhada entre estados e municípios.
As alíquotas exatas ainda estão em fase de regulamentação, mas estimativas preliminares indicam que a carga final poderá variar conforme o setor e a localização do consumidor final. A tabela publicada pela Receita já antecipa algumas alíquotas fixas e condicionadas.
Empresas do Simples Nacional: créditos podem ser limitados
Embora a Reforma Tributária tenha preservado o Simples Nacional, contribuintes optantes desse regime não terão, em geral, direito à apropriação de créditos de IBS e CBS — salvo em situações específicas. Isso pode afetar a competitividade frente a empresas que poderão gerar e transferir créditos na cadeia produtiva.
Empresas que atuam como fornecedoras em setores com grandes compradores precisarão avaliar se vale a pena permanecer no Simples ou migrar para outro regime, como o Lucro Presumido, em razão do aproveitamento de créditos.
Onde acessar a tabela oficial de créditos presumidos
A tabela completa de créditos presumidos está disponível para download no Portal Nacional da Nota Fiscal Eletrônica (NF-e), na aba “Documentos Técnicos”. O arquivo inclui a descrição de cada hipótese, o artigo da lei correspondente, a forma de escrituração e a vigência das regras.
https://www.contabeis.com.br/noticias/71655/publicada-tabela-de-creditos-do-ibs-e-cbs
Repetitivo afasta PIS/Cofins sobre produtos e serviços destinados à Zona Franca de Manaus
Data: 07/07/2025
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que as receitas decorrentes da prestação de serviços e da venda de produtos nacionais e nacionalizados no âmbito da Zona Franca de Manaus, seja para pessoas físicas ou jurídicas, estão livres da contribuição ao Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).
Ao fixar o entendimento sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.239), o colegiado considerou que a concessão de incentivos fiscais à Zona Franca de Manaus deve ter interpretação extensiva, de modo a reduzir as desigualdades sociais e regionais e contribuir para a proteção do meio ambiente e a promoção da cultura da região amazônica.
Com a definição da tese, podem voltar a tramitar todos os recursos especiais e agravos em recurso especial sobre o mesmo assunto, na segunda instância ou no STJ, que estavam suspensos à espera do precedente.
Decreto-lei não proíbe incentivo quando destinatário da venda é pessoa física
O relator do repetitivo, ministro Gurgel de Faria, apontou que a análise do tema exige a interpretação conjunta da realidade mercadológica atual, dos dispositivos constitucionais que tratam da finalidade da Zona Franca de Manaus e do artigo 4º do Decreto-Lei 288/1967, que regula essa zona econômica especial.
“O decreto-lei não traz nenhuma referência à característica do consumidor destinatário da venda na Zona Franca de Manaus, ou seja, se esse é pessoa física ou jurídica, motivo por que não há razão para afastar os incentivos fiscais voltados à Zona Franca de Manaus quando o adquirente/consumidor for pessoa física residente naquela região”, observou o ministro.
Segundo ele, também é irrelevante saber se o negócio ocorre entre pessoas situadas na Zona Franca de Manaus ou se o vendedor está fora dos limites do polo industrial, por respeito ao princípio da isonomia. “A adoção de compreensão diversa aumentaria a carga tributária exatamente dos empreendedores da região – que devem ser beneficiados com os incentivos fiscais –, desestimulando a economia dentro da própria área”, explicou.
Leis que regem PIS e Cofins afastam incidência desses tributos na exportação
Ao analisar a legislação que trata do PIS e da Cofins, Gurgel de Faria comentou que a isenção para as receitas de exportação estava prevista no artigo 5º da Lei 7.714/1988 e no artigo 7º da Lei Complementar 70/1991. Posteriormente, com a entrada em vigor das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 e a introdução do regime não cumulativo do PIS/Cofins, houve a expressa desoneração das receitas decorrentes de exportação.
“Portanto, como as leis referidas, quando cuidam da exportação, afastam expressamente a incidência da contribuição ao PIS e à Cofins em sentido amplo (pessoa física, jurídica, mercadoria e prestação de serviços), esse tratamento, automaticamente, deve ser concedido à Zona Franca em razão da interpretação sistemática que deve ser conferida às referidas normas e ao artigo 4º do Decreto-Lei 288/1967”, concluiu o ministro.
Acórdão no REsp 2.093.050.
- ESTADUAIS:
TJMT afasta ITBI na transferência de bens para holding familiar
Data: 04/07/2025
Um acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso (TJMT) afastou a cobrança de Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) na integralização de capital social feita por sócios a uma holding familiar. Os desembargadores, por unanimidade, entenderam que a transferência de seis imóveis de uma mesma família para a empresa, pelo valor histórico, não traz a incidência do tributo, pois não foi formada reserva de capital. Logo, para a Corte mato-grossense, o caso é de imunidade tributária.
A decisão, segundo tributaristas, é a primeira da segunda instância do Estado favorável a contribuintes – algo também raro em outros tribunais estaduais.
O relator, o juiz convocado Luis Otávio Pereira Marques, fez uma distinção em relação à tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de que a imunidade do ITBI, prevista na Constituição Federal, sobre imóveis incorporados a pessoa jurídica, se limita ao capital social. De acordo com o Supremo, é passível de tributação o que excede esse montante (Tema nº 796).
A tese foi julgada pelo STF com repercussão geral, ou seja, é vinculante e deve ser aplicada para todos os casos na Justiça sobre o tema. De acordo com especialistas, o precedente, de 2020, fez com que muitos municípios lavrassem autos de infração para cobrar o ITBI sobre a diferença entre o valor de mercado do imóvel (maior) e o valor histórico (menor), como ocorreu no caso analisado pelo TJMT, com a Saad Melo Investimentos e Participações.
O município de Cuiabá cobrou R$ 37 mil de ITBI (o equivalente a R$ 70 mil hoje), pois entendeu que as propriedades não foram transferidas pelo valor de mercado. Por isso, arbitrou a base de cálculo considerando que os imóveis valiam R$ 3,6 milhões.
A integralização foi feita com base em valores históricos (R$ 1,8 milhão), o que é permitido pela legislação. É uma forma de adiar o pagamento de Imposto de Renda sobre o ganho de capital – que será pago quando houver a venda.
O magistrado afastou a incidência de ITBI por não haver a formação de reserva de capital (parte do patrimônio líquido de uma empresa), como havia ocorrido no caso julgado pelo Supremo. A decisão foi dada pelo Regime de Cooperação da 2ª Câmara de Direito Público do TJMT em junho deste ano, reformando uma sentença desfavorável.
“No caso concreto, não há demonstração de que houve destinação de valor excedente à formação de reserva de capital, tampouco constituição de parcela distinta da integralização, inexistindo base para aplicação da tese do Tema 796”, afirmou o magistrado na decisão (processo nº 0050811-33.2015.8.11.0041).
Marques ainda levou em conta que o município de Cuiabá fez a cobrança sem antes instaurar um processo administrativo. Isso violaria “os princípios constitucionais do contraditório, ampla defesa e devido processo legal”, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em recursos repetitivos (Tema 1113). Até a Procuradoria-Geral da Justiça de Mato Grosso concordou com o argumento e foi favorável ao contribuinte.
A Secretaria Municipal da Fazenda defendeu, nos autos do processo, ser possível a cobrança tributária. E que a operação configurou planejamento patrimonial familiar, “o que reforça a inaplicabilidade da imunidade tributária ao valor excedente”. Argumentou, ainda, que o contrato social não comprovou a destinação empresarial dos imóveis.
Mas esse não foi o entendimento que prevaleceu. O advogado Alex Ferreira, sócio do FCS Advogados, que atuou no caso, diz que a decisão foi a primeira favorável no TJMT. “A jurisprudência consolidada do tribunal é de aplicar o Tema 796 sem fazer distinção. Essa decisão foi mais cirúrgica”, diz. “Como não fizemos reserva de capital, não daria para aplicar o Tema 796, então não tem porquê tributar a diferença” afirma.
“Quando tem a reserva de capital fica bem claro que o próprio contribuinte reconhece que o imóvel vale mais, mas é diferente do nosso caso”, adiciona. “Foi demonstrado na declaração de Imposto de Renda que o valor é o mesmo da integralização, não tinha reserva de ágio”, completa a advogada Cindy Schossler Toyama, da mesma banca.
Ana Flávia Fagundes, do escritório AleixoMaia, diz que essa discussão ocorria antes da decisão do STF. “Mas ela foi aflorada pela decisão, porque a forma como foi ementada permitiu que municípios vissem uma oportunidade de tributação”, diz, definindo o movimento das prefeituras como “saga arrecadatória”.
Nos tribunais, são raros os casos em que há debate sobre a matéria, o que tem gerado divergência entre as Cortes estaduais. “É um cenário de bastante insegurança com a autuação dos municípios na cobrança de ITBI sobre o que supostamente tá excedendo do capital social”, diz Ana.
Uma esperança pode vir de uma recente decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, em um caso similar ao do Mato Grosso, indica a advogada. Nela, diz que a matéria é infraconstitucional, o que pode levar a análise ao STJ. “Ele não analisou o mérito, mas falou que essa discussão sobre valor venal e o constante na declaração de IR não foi analisa do pelo Supremo”. “Pode ser um avanço nos tribunais estaduais e levar a matéria ao STJ”, adiciona (RE 1548819).
Em nota, a Procuradoria-Geral do Município do Cuiabá (PGM) disse que “respeita a decisão do Tribunal de Justiça, mas, avaliará a possibilidade de recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), ou, até mesmo, ao Supremo Tribunal Federal (STF)”. Afirmou ainda que a arrecadação advinda do ITBI faz parte do orçamento e decisões como esta “configuram perda de receita atingindo a capacidade própria de investimentos”. “Por isso, a necessidade de esgotar a discussão do tema nos tribunais superiores”, disse.
TJSP livra paulistanos da cobrança retroativa de débitos de IPTU
Data: 06/07/2025
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) tem livrado contribuintes paulistanos, que aderiram a um programa de regularização de imóveis, de cobranças retroativas de débitos de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). Para eles, a Lei nº 17.202, de 2019, chamada de “Lei da Anistia”, havia perdoado essa dívida com o Fisco.
Essa lei perdoou os débitos do imposto “decorrentes dos procedimentos de regularizações” de obras concluídas até 31 de julho de 2014 e que atendem condições de higiene, segurança e acessibilidade.
A previsão foi regulamentada pelo Decreto municipal nº 59.164, de 2019. A norma reforça a expressão “pretéritos” para se referir aos débitos que ficam anistiados com a regularização (artigo 36).
A prefeitura entende que só ficam perdoados os débitos anteriores à edição da lei, que entrou em vigor no ano de 2020. Já os contribuintes interpretam que a remissão alcança todas as dívidas até a adesão ao programa de regularização.
O TJSP tem dado razão ao contribuinte em decisões recentes, de maio deste ano. Em um dos processos, o contribuinte aderiu ao programa em dezembro de 2024 para atualizar o valor da área construída. Com base nas informações prestadas, a prefeitura fez o lançamento retroativo do IPTU de 2020 até 2024, sobre a diferença entre a área informada anteriormente e a área regularizada, que era maior.
O contribuinte obteve sentença favorável na primeira instância da Justiça. O juiz Marcio Luigi Teixeira Pinto entendeu que a cobrança foi ilegal, uma vez que “impõe limitação ao benefício fiscal previsto em lei, o que não pode ser feito por meio de decisão administrativa”.
A prefeitura recorreu, mas o TJSP manteve o entendimento. Para a 18ª Câmara de Direito Público, chancelar a cobrança “esvaziaria a benesse concedida em lei afrontando o seu objetivo, além de violar a legítima expectativa do administrado em regularizar a situação do seu imóvel” (processo nº 1059933-82.2024.8.26.0053).
Um outro processo discutia a cobrança de IPTU sobre um imóvel de 1.000 m², mas a proprietária alegava que ele tinha 683,71 m². A contribuinte impugnou o lançamento indevido do IPTU e, ao mesmo tempo, aderiu ao programa de regularização. A prefeitura acatou a redução da área total, mas não aplicou a anistia do imposto devido entre os anos de 2014 e 2020.
Novamente, a sentença foi favorável ao contribuinte e a prefeitura recorreu. Para a 14ª Câmara de Direito Público do TJSP, porém, como foi emitido o certificado de regularização do imóvel, “não há que se falar em cobrança de IPTU de exercícios pretéritos lançados em decorrência da regularização da área construída (lançamento complementar), uma vez que o contribuinte fez uso da regularização pela denominada Lei da Anistia” (processo nº 1020832-72.2023.8.26.0053).
Nanci Regina de Souza Lima, do NR Souza Lima Sociedade de Advogados, defendeu a contribuinte no caso. Ela diz que nem todos os casos semelhantes chegam ao Judiciário. “As pessoas que querem vender o imóvel, por exemplo, fazem as contas e percebem que talvez seja mais prático pagar, mesmo que a cobrança seja indevida, do que arriscar passar anos questionando na Justiça. É o cálculo do custo-benefício”, afirma.
Já a 18ª Câmara de Direito Público afirmou que “o impetrante faz jus ao benefício da citada lei de anistia, com remissão dos créditos tributários de IPTU pretéritos ao pedido de regularização” (processo nº 1065323-67.2023.8.26.0053).
Jessica Chehter Brand, do Schneider Pugliese Advogados, destaca que a questão é importante porque o prazo para adesão ao programa foi prorrogado até 31 de dezembro de 2025. Assim, se as cobranças retroativas continuarem, poderão desestimular a busca pela regularização.
“A finalidade da lei era regularizar as áreas e não se tornar uma armadilha para os contribuintes”, pontua a especialista. “Por ora, o TJSP está resguardando os contribuintes. Após a regularização, o município poderá cobrar o IPTU normalmente, mas respeitando o prazo da adesão”, diz.
Em nota, a Procuradoria Geral do Município (PGM) informou que mantém a cobrança retroativa “nos casos em que a regularização do imóvel foi solicitada depois de fiscalização da Prefeitura e da cobrança dos valores devidos”. Disse também que só podem ser perdoados os débitos de IPTU que surgiram por causa da regularização feita com base na Lei 17.202. “Se a dívida foi lançada antes, ela não é cancelada, ainda que o contribuinte tenha regularizado o imóvel depois.”
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